o muro caiu e aí…

Hoje, faz vinte anos que o Muro de Berlim ruiu, iniciando ao menos que simbolicamente uma nova era e fechando o século XX.

Não vou fazer nenhuma análise histórica porque não sou historiador. Prefiro lembrar o trailer de “Adeus Lênin”. Nesta produção, um filho faz de tudo para que a mãe comunista que voltou do coma não descubra que a Alemanha está se reunificando. Ele teme que ela enfarte novamente e não resista. Então, faz milagres para tornar um apartamento de 79 metros quadrados o último refúgio da Alemanha Oriental.

Sensível, engraçado, inteligente, o filme é uma boa maneira de se ver a que nos apegamos para ter o pé na realidade…

tempos de paz: entre cinema e teatro

Fiquei fascinado ao assitir “Tempos de Paz”, filme que chegou aos cinemas esta semana e que é, na sua despretensão, uma das mais interessantes realizações brasileiras desde o “Cheiro do ralo” (2007), por exemplo.

É claro que os dois filmes não têm nenhum parentesco, nada que os aproxime do ponto de vista temático ou estético. Enquanto o “Cheiro…” é um exercício de estilo, transgressivo e moldado a ser um cult para certos públicos, “Tempos de Paz” é muito mais um exercício de linguagem, de realização de um cinema mais maduro e consistente nas suas bases.

E essa diferença se dá fundamentalmente porque “Tempos de Paz” é uma versão cinematográfica de uma peça de teatro. Aliás, um texto sensacional, maravilhoso, apontado por boa parte da crítica como o melhor texto do começo do século XXI no país. Do finalzinho de 2001, o texto assinado por Bosco Brasil tem um título mais longo, próprio mesmo do meio: “Novas diretrizes em tempos de paz”. A história não é rocambolesca e não há uma abundância de personagens, pelo contrário. É a justeza, a singeleza e a profundidade de abordagem que tornam o enredo incontornável, insuperável.

Na trama, estamos em abril de 1945. A Segunda Guerra Mundial está no fim, e as forças européias aguardam o armistício. No Brasil, Vargas está no poder, e o Rio de Janeiro ainda é a capital federal. Lá, desembarcam diariamente hordas de refugiados do nazismo e dos horrores da guerra. Um deles é o polonês Clausewitz, que anseia começar uma nova vida no Brasil, onde se fala uma “língua macia, falada apenas por bebês e idosos, por gente que não tem dentes”.

Clausewitz aprendeu o português, mas na imigração, essa condição e outras contradições despertam a suspeita de um burocrata amargurado, embrutecido e descartado pelo sistema. É dele, Segismundo, que Clausewitz depende para receber o visto de permanência no Brasil, e os dois vão travar uma terceira guerra de palavras, aproximando dois mundos e duas vidas separadas pela língua, pela cultura, pelo destino.

Como se vê, não é um filme de ação, mas de reflexão, de emoção. Daí a importância da realização de Daniel Filho, talvez o homem mais importante do cinema nacional hoje, por trás de sucessos de bilheteria como “Se eu fosse você” (1 e 2), “A partilha”, entre outros. Daniel Filho atua, dirige, produz e, de forma naturalmente gregária, reúne em torno de si os melhores profissionais nos desenhos mais comercializáveis do produto cinematográfico. “Tempos de Paz” não deve se tornar um caminhão de dinheiro como “Se eu fosse você 2”, mas é justamente o sucesso arrasador deste que permite e dignifica a execução de um projeto como o de “Tempos…” Com isso, Daniel Filho marca mais uma vez o seu nome na história do cinema nacional, agora com coragem e maturidade.

Mas a importância de “Tempos de Paz” está também na transposição, na tradução, no trabalho de versão de linguagens. O texto é, como já disse, originalmente uma peça teatral, tem o tempo dos palcos, a ação dramática como base, os diálogos fortes e bem cortados como alicerce, o espírito das coxias. Para não perder em substância ou forma, o diretor convidou o próprio Bosco Brasil para escrever o roteiro, o que se revelou na melhor opção. Ajustes foram feitos do ponto de vista formal, permitindo que o público respire de vez em quando, olhando a bela baía carioca, cenas externas aos porões do cais 22, e por aí vai. Foi adicionado mais um elemento, próprio do cinema: um acerto de contas com o passado. Dois personagens que não existem na peça surgem no roteiro cinematográfico e ajudam a conduzir a trama num embrião de thriller. O próprio Daniel Filho interpreta o elemento-chave deste acerto de contas, um médico sem nome que resistiu ao governo de Vargas.

Nos papéis principais estão Dan Stulbach, na pele do imigrante polonês, e Tony Ramos, como Segismundo. Aliás, os realizadores não tiveram pudor em manter elementos bem sucedidos no teatro. Stulbach já vivera o personagem nos palcos, ao lado de Jairo Mattos. E tanto Tony Ramos quanto Stulbach estão so-ber-bos em seus papéis, num duelo de interpretação, que arranca risos nervosos, lágrimas furtivas e uma ânsia pelo desfecho daquele tormento criado entre eles. O público precisa perceber que estamos diante de um momento histórico da interpretação no cinema nacional, e isso não é exagero. Muito ainda vai se falar do duelo entre Ramos e Stulbach, como o encontro de dois atores de gerações diferentes mas que não encenam, mas contracenam, o que não é fácil quando se trata de cinema, uma arte tão cheia de cortes de câmera para enquadramento e de interrupções do fluxo interpretativo dos atores.

Por fim, a música adequada de Egberto Gismonti e uma belíssima homenagem dos realizadores aos refugiados da Segunda Guerra que chegaram ao Brasil e contribuíram para a nossa cultura e desenvolvimento… Por falar em homenagem, Bosco Brasil mantém a trama de seu texto original que resulta numa extraordinária homenagem e reconhecimento ao teatro, para além de sua utilidade num mundo repleto de desgraças… “Tempos de Paz” não nasce como um clássico do cinema nacional. Não parece ter essa pretensão. É uma realização singela, bem acabada, digna e honesta. Mas por isso tudo uma importantíssima obra para a cinematografia de qualquer país.

não se engane: “intrigas de estado” não opõe jornalistas e blogueiros

A primeira coisa que ouvi de “Intrigas de Estado” era que o filme dirigido por Kevin MacDonald colocava frente a frente para um combate jornalistas e blogueiros, personagens talhados a se odiar e se autodestruir. Confesso que demorei um pouco para assistir receando encontrar um enredo maniqueísta e raso. Mas jornalista não deve acreditar nos primeiros comentários que ouve, precisa é checar, conferir, provar a coisa.

Pois fiquem sabendo que “Intrigas de estado” (State of Play, no original) não opõe jornalistas e blogueiros e, por isso, não alimenta guerrinhas que se insinuam em ciclos cada vez mais curtos. Há exatos dois anos, aqui mesmo no Brasil, uma campanha do Grupo Estado causou polêmica na internet, comparando blogueiros a chimpanzés e a gente muito esquisita. À época, não quis embarcar numa briga intestina que para mim não tinha o menor sentido. Vi que não se tratava de algo apaixonado, mas apenas business.

No caso de “Intrigas de Estado”, a coisa também é bem diferente. O enredo coloca o jornalista Cal McAffey (interpretado por Russell Crowe) ao lado da blogueira Della Frye (Rachel McAdams) na cobertura de um caso que parece, no início, um simples assassinato de um anônimo mas se converte num caso de conspiração nacional, com implicações bilionárias e pessoais. Outra morte – agora de uma assistente do congressista Stephen Collins (Ben Affleck) – coloca mais gasolina na fogueira, pois entram em cena elementos como infidelidade conjugal, corrupção política, lobbies em Washington, as ascendentes empresas de segurança privada que alistam mercenários… enfim, juntaram sexo, poder, dinheiro e guerra! Para temperar, os produtores agregaram interesse público, conflitos de interesse e ética jornalística num cenário de transição midiática.

Veja o trailer

A trama coloca em primeiro plano uma dupla que parece no início muito contrastada, mas que ao longo do filme vai se mostrando afinada e convergente: de um lado, o jornalista tarimbado, conhecedor de lugares e pessoas, criterioso e desorganizado, comprometido com a profissão mas conflitado pois é amigo de longa data do deputado em apuros. De outro, a jovem blogueira, imediatista, impulsiva e levemente arrivista, mas que na verdade é apenas uma jovem repórter. Não, a dupla não vira um casal. Há pouco espaço e tempo para romances aqui. A relação que se mostra é muito mais de mestre e aprendiz, e é aí que a coisa está: o filme não opõe blogueiros e jornalistas, nem o velho contra o novo jornalismo.

Na minha leitura, o filme discute o que é essencial no jornalismo, o que faz do jornalismo algo relevante e útil na sociedade. Neste sentido, as críticas que o diretor deixa escapar pela boca do jornalismo experiente têm alvo certo: o jornalismo de sensação, a velocidade como fetiche, a correção e a precisão como acessórios, e a fofoca como modo de existência da informação. Cal McAffey dirige as suas ações para o que está por trás das versões que vão se colocando. Como quem tenta trazer à tona a verdade, o segredo oculto pelos interesses corruptores. O jornalista tenta convencer a jovem blogueira e a veterana publisher que há algo por trás daquilo tudo, algo que é essencial, que é o espírito da matéria.

Russell Crowe encarna esta perspectiva, a do homem-essencial. Seu jornalista anda com cabelos desgrenhados, está visivelmente fora de forma, come de forma desregrada, se veste de qualquer maneira. Seu carro é um velho Saab de 1990, azul calcinha. Seu apartamento até que é arrumado, mas a sua mesa no jornal é a sucursal do inferno… Cal McAffey é despojado, informal, focado no que é essencial. É avesso ao deslumbramento, ao imediato, à primeira impressão. É instintivo, racional e pouco convencional nos seus procedimentos. Afinal, a situação é delicada, e a distância que precisaria manter de suas fontes não é a ideal…

Você já viu isso…

“Intrigas de Estado” lembra mesmo “Todos os homens do presidente”, dirigido por Alan Pakula. Mas é deliberado, conforme reconhecem os próprios realizadores. A redação do jornal Washington Globe é um decalque de qualquer grande redação, e ainda mais a do Washington Post recriada para o clássico de 1976. O clima de suspense e de intriga segue os mesmos passos, e até mesmo a sequência da checagem de informações pelos jornalistas se remete ao trabalho de Bob Woodward e Carl Bernstein, interpretados por Robert Redford e Dustin Hoffman. (Veja o trailer)

Não só isso. “Intrigas de Estado” traz a ótima Helen Mirren no papel da publisher Cameron Lynne, fácil de ser comparada às editoras mandonas e inesquecíveis vividas por Glenn Close em “O jornal” e por Meryl Streep em “O diabo veste Prada”. Grandes atrizes em papéis fortes e decisivos.

O que não havíamos visto é a belíssima sequência final que mostra o processo industrial de impressão do jornal. Da composição, passando pelo fotolito das páginas e pela gravação da chapa de metal, vamos ao encaixe nas rotativas e o acoplamento das imensas bobinas de papel. Depois, as esteiras, a velocidade, as manchetes, a cadernização, os encartes, a dobra, o refile e o empilhamento dos exemplares. Por fim, os fardos de jornais são embarcados nos caminhões e seguem para a entrega nas bancas. Sim, é isso mesmo: contei o final do filme. Mas isso nem é o essencial, o essencial está em outro ponto, momentos antes do que contei.

Para Débora Miranda, do G1, o filme presta uma homenagem ao “velho jornalismo”. Talvez, talvez. Mas vejo mais como uma reafirmação do que é essencial no jornalismo, daquilo que mais importa nessa coisa ininterrupta de correr atrás dos fatos e contá-los da melhor maneira possível. O filme não tem gorduras, é enxuto e sem grandes efeitos especiais. Os cenários são cotidianos, os figurinos realistas e convencionais. A trilha sonora passa despercebida e até mesmo se apela para sequências onde sequer há fundo musical, num completo silêncio, magreza total. O filme se apóia na história, nas boas interpretações, nas idéias sérias que nos são atiradas no colo. Não há firulas nem penduricalhos, só despojamento e não-deslumbramento. Justamente, valores que o jornalismo – seja ele novo ou velho – deveria sempre cultivar…

abuso infantil no cinema, uma dissertação

Outro dia, comentei que minha orientanda Juliane Guedes defendia sua dissertação sobre identidades de professores em blogs. A coisa repercutiu muito bem na blogosfera, o que me deixou bastante contente com o fato de ver mais gente pensando e pesquisando esse tema. Pois não é que outra orientanda também anda fazendo cartaz por aí?

Noemi Loser defendeu dia 16 sua dissertação sobre abuso infantil no cinema nacional contemporâneo e já está dando entrevista. Saiu uma no Cotidiano, excelente projeto multimídia do Jornalismo da UFSC.

Claro que eu tô orgulhoso, né? Poderia ser diferente?

notas de férias, porque elas estão no fim

Eu sei que talvez este post nem interesse à meia dúzia de meus leitores fiéis, mas isso aqui é um blog, né? O que significa dizer que também é um bloco de notas, um amontoado de registros cibernéticos…

Nesses dias de férias, não subi o Everest, não cacei tubarões no Pacífico Sul nem desmascarei agentes secretos da ABIN, inflitrados nos meus lugares de convívio social. Eu disse estar de férias, e essas coisas eu só faço quando estou mesmo a trabalho. Mas pra não dizer que minhas férias foram modorrentas, vi uns filminhos, li uns livrinhos, coloquei as correspondências em dia, joguei uns joguinhos e peguei muita praia. Já escrevi alguma coisinha sobre isso aqui, mas ofereço outro aperitivo:

(*) Neuromancer, o livro de William Gibson, é uma experiência impactante. Há pelo menos 15 anos eu queria lê-lo, desde que li Johnny Mnemonic, conto do mesmo autor e que gerou um filme homônimo com Keanu Reeves no papel-título. Lembro que a extinta revista General trouxe o conto encartado numa edição, num formatinho pocket, que arranquei de um amigo meu. Desde então, quis ler mais William Gibson, e só pude agora, numa edição comemorativa dos 25 anos do lançamento (e que traz um posfácio da amiga Adriana Amaral). Neuromancer é um choque no uso da linguagem, na capacidade imaginativa de se conceber pirações cibertrônicas, na intensidade narrativa e na capacidade de se manter em pé. (Nem Case deve ter vislumbrado ir tão longe…)

(*) Já escrevi aqui outras vezes: sim, sou um retardado. Só essa semana assisti a Onde os fracos não têm vez, que levou quatro Oscar ano passado. É um filme melancólico, vertiginoso, atordoante. Daqueles em que a gente passa por uma cena e ainda se pergunta se aquilo mesmo aconteceu ou se os diretores – no caso, os irmáos Cohen – estão aplicando algum golpe na platéia. Que nada! Não tem golpe. Tem cinema de sobra, de gente grande. Cinema que mostra que a vida é mais complicada do que os faroestes antigos mostravam.

(*) House voltou com a quinta temporada. O primeiro episódio – painless – é legalzinho, mas fraco para ser um abre. Se você não viu ainda, calma. Não há mudanças no hospital. Cudy continua tentando adotar um bebê + Kutner e Taub continuam sustentando a escada dos demais + Thirteen e Foreman não foram além daquele beijo + Wilson e Cameron quase nem deram o ar de sua graça + House salvou o dia.

(*) Já Lost está eletrizante. Os dois primeiros episódios vêm em grande forma, com mistérios, conexões improváveis e sacadas de roteiro inacreditáveis. Pra ser sincero, já nem esperava muito da série. Sabe por quê? Os produtores não têm pena da gente. Fazem 11 ou 12 episódios e depois ficam meses hibernando, e nisso, a nossa curiosidade provoca enfartos, surtos de histeria, etc… A série voltou tão boa que até tornei a ler spoilers

(*) Descobri uma nova poeta: Ana Elisa Ribeiro. Jorge Rocha, o ExuCaveiraCover, seu marido, me mandou Fresta por onde olhar, livro da moça que é muito bom. Confesso: tenho o maior preconceito com poetas e livros de poesia. Antes de me espancarem, eu explico: é que parece que todo o mundo escreve poesia ou sabe fazer isso. Então, a gente vê de tudo por aí, e o pior é o que impera. Tem pretensão, tem espalhafato, tem forçação de rima. Com Ana Elisa Ribeiro, não vi nada disso. Existe maturidade, existe bossa e malícia, e existe uma grande intimidade com as palavras.

(*) Bolt – o super-cão é surpreendente. Pra ser uma animação da Disney, vi pouquíssima mídia sobre ele. Mas o resultado é muito bom, muito divertido e tal. Assisti com uma criança de quatro anos e foi ela quem me arrastou pra fora da sala do cinema quando subiam os letreiros. Wall-E é melhor, mas não faz mal. Bolt tem bons diálogos, e uma excelente dublagem brasileira. Maria Clara Gueiros está ótima na voz da gatinha Mittens.

(*) Rygar – The Legendary Adventures é bonzinho, mas seus gráficos perdem muito para os jogos atuais do PlayStation. A história é bobinha: um gladiador com amnésia tem que salvar uma princesa sequestrada. Para isso, transita entre cinco ou seis mundos diferentes, enfrentando seres mitológicos dos mais diversos. O jogo é fácil, sem grandes evoluções. Tanto é que eu consegui zerar sem roubar (lendo detonados na internet…).

As férias não terminaram, e isso não é um balanço. É mesmo um sintoma de que estou aproveitando melhor os dias e as noites. Semana que vem retorno ao trabalho, não sem uma ponta de remorso. Pronto, falei!

50 filmes sobre ética jornalística

Os títulos abaixo – num primeiro plano ou não – acabam tocando em temas delicados, em dilemas da ética jornalística.

Divirta-se!
15 Minutos (2001)
A fogueira das vaidades (1990)
A montanha dos sete abutres (1951)
A morte ao vivo (1980)
A primeira página (1974)
A princesa e o plebeu (1953)
A síndrome da China (1981)
A um passo do poder (1991)
Adoro problemas (1994)
Amor eletrônico (1957)
Assassinato por encomenda (1985)
Ausência de malícia (1981)
Bem-vindo a Sarajevo (1997)
Boa noite e boa sorte (2005)
Cidadão Kane (1941)
Crime verdadeiro (1998
Doces Poderes (1995)
Em defesa da verdade (1985)
Giro City – a verdade proibida (1982)
Herói por acidente (1992)
Íntimo e Pessoal (1995)
Leões e cordeiros (2007)
Mera coincidência (1997)
Noiva em fuga (1999)
Nos bastidores da notícia (1987)
O ano em que vivemos em perigo (1983)
O dossiê pelicano (1993)
O informante (1999)
O jornal (1994)
O poder da notícia (1998
O povo versus Larry Flint (1996)
O preço de uma verdade (2003)
O quarto poder (1997)
O repórter (1986)
O show da vida (1998
Os donos do poder (1986)
Páginas da revolução (1995)
Profissão: repórter (1975)
Quase famosos (2000)
Rede de intrigas (1976)
Reds (1981)
Salvador, o martírio de um povo (1981)
Sob fogo cerrado (1983)
Terra de ninguém (2001)
Terra em transe (1967)
Todos os homens do presidente (1976)
Um grito de liberdade (1987)
Um grito no escuro (1989)
Veronica Guerin: o custo da coragem (2003)
Vlado: 30 anos depois (2005)

blogs, jornalismo e as férias

Sim, estou de férias. Por isso, os posts são preguiçosos e esparsos, quase telegráficos e bissextos…

(*) Quem confia nos blogs? Paul Bradshaw duvida da questão.

(*) Por que as pessoas lêem blogs ao invés de sites de notícias? André de Abreu responde.

(*) Blogs são um novo gênero jornalístico? Frédéric Filloux pensa (alto) sobre isso.

(*) Qual o futuro do jornalismo online? No Nieman Report, você encontra muitos artigos que tentam responder à questão.

(*) Nós, de Marcelo Camelo, não é lá essas coisas. Tem faixas bem bonitas, mas o conjunto é inconstante. Dá saudades de Los Hermanos.

(*) Blindness é lindo. Fernando Meirelles acerta a mão e nos incomoda com a parábola que Saramago urdiu em suas páginas.

(*) A troca é angustiante e bem realizado. Clint Eastwood é um ótimo diretor e um sensível compositor de trilhas. Deu um papel marcante para Angelina Jolie, e mostrou – mais uma vez – que o mal existe, está entre nós e nem sempre o enxergamos com a nitidez necessária.

asilo arkham, uma adaptação

Existe um lugar sombrio, tenebroso, assustador. É escuro, úmido e com criaturas repugnantes. Gemidos e gritos histéricos são ouvidos. Nada funciona direito. As paredes parecem ter olhos e ouvidos. E aquilo lá está lotado de gente insana, perdidamente insana.

O Asilo Arkham é assim. Um lugar para não esquecer. E pra gente se arrepiar quando dele se lembrar.

É diferente das pirotecnias cinematográficas que vêm recheando os filmes do Batman. Talvez caiba nesses filmes apenas em parte, apenas como uma referência do depósito de vilões-loucos que alguns queriam transformá-lo. Mas o Asilo Arkham é um pouco o que Conrad escreveu: é o coração das trevas, onde o horror sussurra no seu ouvido, onde você se volta pra trás após sentir um arrepio estranho na espinha.

Os anos 80 e 90 foram realmente gloriosos para os quadrinhos, principalmente por conta de um formato novo para os brasileiros: a graphic novel, que nada mais era do que quadrinhos com temáticas mais adultas, com revisões de personagens, com inovações gráficas e com altíssima voltagem de ação. Um dos melhores títulos a circular no país foi Asilo Arkham, escrito por Grant Morrison e ilustrado por Dave McKean. Aterrador. Quem leu, tremeu ao conhecer esse lugar que é o próprio inferno.

No vídeo abaixo – que vi primeiro no Nota 7 -, há uma adaptação literal, quase quadro-a-quadro do original dos quadrinhos. Sente, veja, ouça e veja para onde os filmes do Batman poderiam caminhar.

seis filmes: comentários muito pessoais

Porque hoje é sábado e porque faz um friozinho preguiçoso, deixo aqui comentários muito pessoais sobre seis filmes que vi nos últimos dias:

O Fim dos Dias
Perdi a vez de assisti-lo no cinema, e até me arrependo agora. O filme de M.Night Shyamalan é envolvente, interessante, inteligente e despretensioso. Na verdade, estava meio arredio depois de ver Sinais e a A Vila, mas o cineasta voltou em grande estilo. É suspense e terror em doses fartas, sem efeitos especiais muito pirotécnicos. É desses filmes que – mesmo após assistir – a gente fica pensando, pensando, pensando… Para quem quer sobreviver.

Kung-Fu Panda
A animação é ótima, divertida e empolgante. A versão do cinema dublada é competente e engraçadíssima. As referências aos filmes de artes marciais estão lá, mas mesmo quem não as identifica assiste com prazer. Fui ver com amigas e meu filho. Saímos da sala dando caratê em todo o mundo. (O joguinho do Play Station também é bem divertido, focado na história, mas tem um porém: é curto). Para quem não tem preconceito com desenhos animados.

Wall-E
Outra animação pra ficar. Imagine 15 minutos de filme sem diálogos, sem gente, num cenário inóspito e você não desgrudando os olhos da tela. Isso acontece. A história de amor entre robozinhos e o futuro da Terra entretém, enternece e diverte. Referências explícitas a E.T. e a 2001 – Uma odisséia no espaço. Para quem não é robô.

Pecados e Tentações
Falou-se muito da estréia de Leila Lopes no cinema pornô. Depois de ver o trabalho, acho que falaram demais. Leila está bonita e charmosa. Mas seu desempenho, digamos assim, fica bem aquém do esperado. Não é uma estrela da arte, o enredo é bobo e só tem três transas, duas com a protagonista. Rita Cadilac e Gretchen vestiram (?) melhor a camisa… Para quem é curioso.

O Amor nos Tempos do Cólera
A adaptação do romance de Gabriel García Márquez para o cinema resultou num filme com duas horas e quarenta minutos. É um épico, mas a gente se envolve, se emociona e se diverte. Fernanda Montenegro faz a mãe do protagonista, vivido na maturidade por Javier Barden. Os dois estão estonteantes na interpretação. As locações são lindas e a trilha sonora mostra, entre outros bons momentos, uma Shakira altamente romântica. Para quem quer se apaixonar.

Antes de partir
Uma amiga minha deu a chave: é um filme que tem tudo para ser piegas e contorna isso muito bem. Pois é. A história de uma amizade entre pacientes terminais reúne Morgan Freeman e Jack Nicholson nos papéis principais. O enredo reserva pequenas e divertidas surpresas, mas o que fica é uma espécie de “lição final”. Aquilo de que a vida é muito mais. Para pessoas sensíveis e duronas.

desejo e reparação, eu vi

Noite passada, mesmo que entrecortado, assisti a Desejo e Reparação, adaptação do romance de Ian McEwan para o cinema pelo diretor Joe Wright. Vi e devorei os extras da versão do DVD. Vi e fiquei louco para ler o livro que originou o filme.

É uma história pungente, envolvente, dilacerante. Desses dramas românticos de guerra, a história traz à tona sentimentos que a gente luta a vida inteira pra esconder. Mas é o desejo de reparar um imenso erro que move os dedos da narradora.

As cenas rodadas em steadycam para relembrar a desocupação de Dunkirk são estupendas, colocam o telespectador no meio da praia coalhada de loucura, desolação, fumaça e soldados maltrapilhos.

Buscar o perdão, tentar a redenção. Que motes para uma história!!!

jogo subterrâneo, o filme e o site

 

Sábado à noite, zanzando pela TV, acabei trombando com Jogo Subterrâneo, filme de Roberto Gervitz que foi exibido pela Cultura. A história é curiosíssima e a sua execução, singela, tocante e competente. Um solitário pianista de bar cria um jogo pessoal para encontrar a mulher da sua vida. Cola uma planta das linhas do metrô de São Paulo na parede e escolhe aleatoriamente uma estação para onde irá. No caminho, escolhe uma mulher sozinha e a segue pelas linhas do subterrâneo, mentalmente dirigindo seus passos. Quando a musa escapa de sua programação, ele desiste. Afinal, ele acredita que a mulher da sua vida seguiria a mesma direção dele… Martin, o pianista, recomeça o jogo todos os dias até se deparar com três outras mulheres: uma misteriosa e compreensiva, outra carente e materna, e uma terceira sinônimo de perigos e problemas.

O enredo de Jogo Subterrâneo foi inspirado em “Manuscrito encontrado em um bolso”, conto de Julio Cortázar, publicado na coletânea Octaedro. No cinema, o jogo se esvai com o avançar das estações, muito bem exploradas pela fotografia do filme, atirando em nossos olhos esse lugar incomum que é o metrô: cercado por tantas pessoas e olhares, estamos mais é absolutamente sozinhos, mergulhados em nossos pensamentos-sonhos-memórias.

No elenco, Felipe Camargo, Maria Luisa Mendonça, Julia Lemertz e Daniela Escobar. Aliás, casting bem dirigidinho, extração profunda de emoções. Destaque ainda para a sensível e pungente música de Luiz Henrique Xavier.

Outro destaque: o site do filme. Nele, como não poderia deixar de ser, o visitante participa de um jogo, passando de estação a estação nas linhas do metrô que vão se descortinando. Para isso, tem que adquirir os bilhetes e assim, as paradas vão se apresentando… Trailers, papéis de parede, fotos, informações sobre a película e vídeos… Cortázar adoraria esse site!

Confira o trailer aqui!

blade runner e o que veio depois

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 A conectada Adriana Amaral comenta a entrevista que Ridley Scott deu à Wired sobre os 25 anos de lançamento de Blade Runner. Na versão eletrônica da badalada revista, pode-se ler e ouvir a entrevista, e é maravilhoso revisitar um futuro tão perturbador numa obra tão poderosa. Tanto é que a própria Wired traz num bem produzido infográfico as influências causadas pelo filme em diversas manifestações culturais, que vão da música à linguagem, da arquitetura aos quadrinhos, do cinema à moda.

Sou suspeitíssimo para comentar Blade Runner. É o filme da minha vida. Onde o policial tromba com o filosófico, onde as aparências chapam a realidade e nos conduzem para equívocos certeiros. Onde o drama de um solitário se espalha como grande questão da humanidade. Ontologia, globalização, sobrevivência, multiculturalismo, podridão ambiental, estética noir, robôs que choram, humanos que não choram.

25 anos depois de ser lançado, Blade Runner não descoloriu, não amarelou, não ficou esmaecido. É recente, é atual, é perene. Não adivinhou o futuro, mas quem disse que ele se propunha a isso? E quem disse que, de certas formas, não tenha antecipado o futuro? Nos acotovelamos com ciborgues nos elevadores, nos submetemos a tratamentos que desafiam a ciência e a lógica, nos afundamos em nossas vidinhas medíocres, sucumbimos à catástrofe ambiental, e cada vez menos sabemos o que é, afinal, ser humano…

nosso cinema no oscar

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Não ligo para o Oscar. Não acho que seja um grande prêmio nem ao menos que seja um índice de qualidade de produção. Não mesmo. Basta lembrar que “Rocky, o lutador” venceu na categoria melhor filme no comecinho dos anos 80. (Ou a safra estava muito ruim ou o colégio eleitoral que votou no filme de Stallone não ia ao cinema com freqüência).

Então, não entro nessa torcida por um Oscar. Para mim, é besteira. Como se torcêssemos por nossa miss num concurso de beleza. Claro que isso não me impede de dizer que foi uma injustiça Gwineth Paltrow levar a estatueta de melhor atriz por “Shakespeare Apaixonado” ao invés de Fernanda Montenegro por “Central do Brasil”. A veterana é mais atriz e está a milhas de distância segura da loirinha.

De qualquer forma, e dito tudo isso, preciso confessar que gostei bastante da escolha do governo brasileiro do filme que vai representar o país na triagem para a categoria de melhor filme estrangeiro. Escolheram “O ano em que meus pais saíram de férias”. Não pude vê-lo na telona, mas vi em DVD. E foi um assombro.

Em maio deste ano, no meu blog anterior, cheguei a dar minhas impressões nitidamente emocionadas sobre o filme. Ele é belíssimo. Para que você não precise ir ao meu endereço antigo, reproduzo abaixo o que escrevi à época. Hoje, eu quase nem mexeria no texto. A impressão ficou. As imagens permaneceram.

Noite passada, assisti a O Ano Em Que Meus Pais Saíram De Férias, longa de Cao Hamburger. E já de início, é preciso dizer: é um dos filmes mais emocionantes do cinema nacional dos últimos dez anos. Bem realizado, na medida e sem rodeios, o filme é de uma sensibilidade contagiante.A história é simples: 1970, e os jovens pais de um garoto de uns 8 anos deixam o filho com o avô. Os pais “vão sair de férias”, quando na verdade se intui que são perseguidos políticos. Acontece que o avô morre antes mesmo de o menino ser recebido. Então, Mauro – o menino – é acolhido pelo pessoal do bairro do Bom Retiro, notadamente judeus e descendentes de italianos. Os dias se passam e o menino aguarda os pais, pois a promessa era de que a volta se daria na Copa do Mundo. Simples assim.

Mas vai além. Não é um filme de crianças. Não é um filme com crianças só. Mas é um daqueles que nos fazem voltar à infância. Futebol de botão. Bola de capotão batendo na parede encardida do vizinho. Brincar na rua. Apaixonar-se pela bela atendente da padaria. Tanta coisa… Há também a incontornável solidão da infância que todos sentimos: brincar solitário, mergulhar sozinhos no mundo da fantasia e dos sonhos mais eternos.

Se você gosta de comparações, já temos um Cinema Paradiso, mas sem a homenagem à sétima arte. Já temos um Malena, sem Monica Belucci. Mas não só. Meu entusiasmo me faz lembrar da singela trilha sonora, dos planos inteligentes que recortam o cenário da São Paulo moderna e nos mostram apenas a São Paulo amanhecida, amarratoda, periférica, imunda e inesquecível, amável e perdida no tempo.

Gargalhei, me identifiquei, e me emocionei. Lá pelo final, cheguei a pensar que o filme poderia terminar na bela seqüência que recupera as comemorações em Guadalajara do Tri da seleção. Cenas documentais num belo filtro azul-saudade. Mas não. Cao Hamburger ofereceu mais. Inclusive a narração do personagem na última cena: um punhado de frases que me inundou os olhos”.

quando nietzsche chorou

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Ontem à noite, assisti à versão cinematográfica do best-seller de Irvin Yalom. Muito se tem dito sobre o livro e sobre o autor, cujos títulos circulam pelas livrarias brasileiras. Já pensei em ler, mas ainda não consegui. Mas na verdade, este post está mais interessado mesmo no filme, em como é contado o encontro fictício entre Breuer e Nietzsche.

Vamos por partes, como disse aquele rapaz dos becos de Londres…

Breuer é um médico conhecido na mítica Viena do final do século retrasado, o 19. É rico, afamado, e professor de um jovem médico, o doutor Freud. Aliás, a ele confiou a paciente Bertha, codinome Ana O.

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Pois Breuer é procurado pela irriquieta e irresistível Lou Salomé, amiga íntima de Nietzsche e muito preocupada com seu estado de saúde. O filósofo, ainda desconhecido, anda deprimidíssimo, à beira do suicídio. Lou roga para que Breuer trate do amigo. Breuer se convence – não pela causa em si – mas pela moça em si.

A aproximação do médico e paciente será o fio condutor da história, convidando os demais pacientes a pensar sobre filosofia, sonhos, psicologia, desejos, viva e morte, sentidos da existência, dor e felicidade.

O filme é ruim, seja pela precária ambientação ou pelos desastrados efeitos especiais (defeitos especiais?) que retratam os sonhos e pesadelos de Breuer. Lou Salomé é retratada de forma frívola, superficial, volúvel. Breuer chega a ser caricato. Mas apesar de tudo, algo que se sobresai e ganha a noite. Armand Assante na pele do filósofo. Assante compõe um personagem pulsante, arcado pela culpa e pela dor, carregado de sentimentos represados.

O espectador é devorado pelos olhos esbugalhados de um Nietzsche já adoentado e atormentado. Aliás, com a cabeleira revolta e um imenso bigode cobrindo-lhe a boca, resta ao ator a expressividade de seus olhos e os olhares que dispara. O corpo se movimenta em cena com rapidez, de forma inesperada. O ritmo é sobressaltado, e as mãos do filósofo ganham envergadura de tenazes. Pouco se vê delas. Assim como o próprio tenta esconder seus sentimentos, suas frustrações e medos.

Ele tenta.

As cenas finais, com um Nietzsche em estado de total vulnerabilidade, são lindíssimas, tocantes, transbordantes. A fortaleza rui e os cacos se espalham, mas a uma distância controlada. Por alguns segundos, o filósofo deixa cair-lhe a máscara e revela a si e ao doutor o que tanto estremece seu peito e quase faz explodir sua cabeça.

É um belíssimo trabalho de ator. Foi o que me valeu ao ver o filme.

Gostei muito do Nietzsche que Assante nos apresenta. Ele está nas páginas dos seus livros, nas metáforas poderosas como golpes de martelo, na pregação anti-cristã, na ousadia de contestar a moral vigente.
O Nietzsche de Assante é humano, demasiado humano.

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listinha de filmes

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Kadw vem fazendo seu listão de 100 filmes indicados. Pedro Doria hoje convida para listar os dez filmes que mais marcaram a vida de seus leitores. (Na verdade, o convite já é um meme).

Convite aceito.

Blade Runner – Eu sou Deckard.

 

Cidadão Kane – O choque do velho que me deixa renovado. Sempre.

 

Cinema Paradiso – Quando eu me transformo em cachoeira.

 

Antes da Chuva – O tempo é circular. A vida é mais.

 

O livro de cabeceira – a poesia numa fábula de Peter Greenaway. Livros e olhos rasgados. Janelinhas na telona.

 

Lavoura Arcaica – Um filme verde, cuja voz ressoa o velho escritor aposentado.

 

Terra em transe – Glauber pulsa no olho arregalado de Paulo Autran, na voz aveludada de Jardel Filho e no sorriso sacana de Paulo Gracindo.

 

Apocalipse Now – This is the end, my only frien, the end!

 

A festa do monstro maluco – Sessão da tarde, o paraíso.

 

Tubarão – Dá medo até hoje.