Hordas de bolsonaristas invadiram ontem, 8, os principais prédios públicos da república. Os palácios mais importantes dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário foram também vandalizados e saqueados em atos de terrorismo à luz do dia. Os principais jornais do Brasil e do mundo estampam hoje, 9, a vergonha inesquecível.
A saga de um leitor por um livro
O leitor acorda com uma obsessão: ler aquele livro antes daquela viagem.
Ele sabe que não tem o volume em sua coleção. Do autor, o leitor só tem um título, que descobre que deu de presente para a esposa há 15 anos. É a dedicatória quem lembra, e mais: com espírito romântico, chega a prometer a tal viagem, menos por convicção e mais para embelezar o recadinho de dedicação.
Satisfazer a obsessão será fácil, pensa o leitor. Basta acessar a Amazon e comprar uma cópia eletrônica do livro, mas a ilusão termina em menos de um minuto. Por razões misteriosas, o único título do autor indisponível em ebook é justamente o que ele procura. Pensa em encomendar um exemplar físico, mas a entrega pode demorar mais do que ele poderia suportar.
O leitor, então, aciona o modo furtivo e recorre a sites de download clandestino de livros. Nada. Realmente, o objeto da sua obsessão não está acessível em bits. Vai até a Estante Virtual e até encontra a preços módicos, mas a entrega prevista é daqui a um século!
Cabe então uma busca peripatética por livrarias e sebos da cidade. O obcecado arruma uma desculpa qualquer para ir ao centro, convence o filho a escoltá-lo, e eles varrem os sebos campeões em ácaros e rinite, e… nada! Encontram outros títulos do autor, mas nada próximo daquela santa perseguição.
Num dos capítulos finais, ele acelera o carro para chegar a tempo de encontrar um sebo de bairro aberto. Não! Inexplicavelmente fechado antes das seis da tarde… com a tromba arrastando, o leitor volta para casa, quase derrotado. À noite, emaranhado em pensamentos, tem uma ideia que vai salvá-lo de todo o mal: a biblioteca da universidade!
O sistema eletrônico de busca arranca um sorriso do rosto do leitor. Ele só precisa atravessar uma noite de sono até resgatar o volume naquele deserto das férias escolares. Os corredores estão mal iluminados e o obcecado teme pelo fracasso quando se depara com um setor de estantes isoladas por fita e lonas. As chuvas do mês passado interditaram uma parte do acervo, muito próximo da numeração que ele buscava. Muitos livros foram atingidos pelas malditas goteiras e estão indisponíveis. Precisam se recuperar. Com passos miúdos e o coração apertado, o leitor contorna o espaço proibido e chega à estante; percorre com os dedos as prateleiras e alcança a lombada mais procurada do mundo.
De várias maneiras, aquele fanático tentou comprar o livro, e não conseguiu. Foi uma biblioteca pública que pacificou seu coração. Foi essa invenção perigosa – juntar milhares de livros e permitir que as pessoas os leiam gratuitamente! – que salvou seu dia. Foi essa criação antiga – bibliotecas públicas -, a encarnação do espírito do bem comum, que permitiu ao leitor segurar aquele surrado volume.
Lula eleito nas capas dos jornais
Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente de República ontem, 30, com mais de 60 milhões de votos. É a terceira vez que vestirá a faixa presidencial, um feito inédito, pois nem mesmo Getúlio Vargas foi eleito três vezes para o Palácio da Guanabara. As primeiras páginas dos jornais hoje são históricas.
A leitura da carta pela democracia nas capas dos jornais
Atos cívicos em todo o país marcaram o 11 de agosto de 2022 com leituras da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros, iniciativa ecumênica para alertar sobre os riscos de golpe à democracia nacional.
Os principais jornais do país dedicaram espaços generosos em suas primeiras páginas no dia seguinte. Chamo a atenção para a Gazeta do Povo, que preferiu destacar a pífia redução do preço do diesel, que aconteceu coincidentemente ontem…
Imprensa ainda hesita diante das mentiras do presidente
O presidente da República reuniu 70 embaixadores estrangeiros para mais uma investida ao sistema eleitoral brasileiro. Hoje, 19 de julho, os principais jornais do país reconheceram que foi mais um ataque, mas apenas um deles teve a coragem (bom senso? senso jornalístico?) de dizer que ele mentiu… aliás, a Folha de S.Paulo também publicou editorial com o seguinte título: “Presidente golpista: Bolsonaro barganha com Congresso liberdade para atacar a democracia; isso tem que acabar”.
Nas capas dos jornais que juntei, destaque também para o Correio do Povo, que trouxe uma foto que traz mensagem subliminar sobre os apoiadores de Bolsonaro.
Transparência no jornalismo: um mapeamento
Acaba de ser publicada a mais recente edição de Ámbitos, periódico científico da Universidad de Sevilla e um dos mais instigantes da área da Comunicação na Espanha.
O número tem um “monográfico” sobre pesquisa e transferência de conhecimento em comunicação, organizado por Sara Loiti-Rodríguez e meu querido amigo Juan Carlos Suárez-Villegas. Além do dossiê, há artigos sortidos e um deles é assinado por mim e minha ex-bolsista de iniciação científica, Juliana Naime Ferrari, onde apresentamos um rápido mapeamento de instrumentos e práticas de transparência no jornalismo.
Para ler o artigo, clique aqui. Para baixar a Âmbitos 57 inteira, clique aqui.
Perdi meu ex-futuro marido
Conheci Frank Maia num casamento.

Era o casamento dos jornalistas Cris Fontinhas e Maurício Oliveira na Ingrejinha da Lagoa. E eu estava de penetra porque não conhecia os noivos e fui de contrabando da minha esposa à época. No final da cerimônia, o Frank veio falar com a gente e foi amor à primeira vista. Uma amizade de milênios reconhecida num segundo. Quem podia resistir àquele sorrisão e um alto astral simplesmente contagioso…
Não deu muito tempo e trabalhamos juntos num jornal, e eu via dia-a-dia como o Frank evoluía no traço, nas gags, na sua arte. Foi pouco tempo, talvez dois anos, sei lá…
Mas a gente se encontrou muitas outras vezes, quase sempre com nossas mãos agarradas a copos, e era sempre como se tivéssemos conversado há dois minutos. Amantes de quadrinhos, trocávamos impressões de um artista ou de outro, e sempre nos prometemos fazer alguma coisa juntos. E rolou uma vez. Escrevi um historinha de duas ou três páginas que ele desenhou. Faz mais de vinte anos e eu nem encontro mais vestígios daquilo. Mas eu não esqueço o que aconteceu depois. Laerte veio a Florianópolis para uma palestra, e estávamos os dois lado-a-lado e perguntamos sobre duplas de criação. Laerte coçou a barba – sim, faz muito tempo – e disse: “Se você tem quem desenhe pra você, se você tem quem escreva pra você, case com essa pessoa!”.

Frank gargalhou, e olhou pra mim com aquela cara de louco dele. Gargalhei também, e prometemos repetir a parceria, mas não aconteceu mais. Em compensação, eu pude acompanhar de perto (às vezes de longe) o meu ex-futuro-marido se tornar o melhor chargista que Santa Catarina já teve. Maior ainda que o ídolo dele, o Bonson, que também já partiu.
Frank viveu e sobreviveu por conta da sua inteligência, do seu traço rápido e de uma alegria que eu nunca entendi de onde vinha. Não havia tempo ruim com ele. Era generoso, estava sempre muito bem informado e não se desgrudava das filhas mais novas. Nos últimos meses, nos encontramos sem querer sempre no centro da cidade, onde frequentamos bar e banca de jornais, desconfio que os lugares que ele mais gostava. Ainda não acredito que ele foi embora. Ele sempre ficava até o final da festa…
Frank casou algumas vezes, teve vários filhos e fez infinitos amigos. Sou um deles. Mas e se a gente tivesse ouvido a Laerte, hein, Frank?!
Baixe o livro!
Temos vagas!
Aqui no Observatório da Ética Jornalística (objETHOS) estamos com vagas abertas para novos pesquisadores e pesquisadoras.
Com o lançamento do edital do Processo Seletivo 2022 do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo da UFSC, nosso grupo de pesquisa pode ampliar a equipe. O PPGJOR vai selecionar pós-graduandos e pode preencher até 20 vagas, sendo 11 de Mestrado e 9 de Doutorado. Como no ano passado, 50% das vagas são destinadas às ações afirmativas: pessoas pretas e pardas, indígenas, quilombolas, refugiados, pessoas trans e pessoas com deficiência.
No objETHOS, são três vagas.
O professor Samuel Lima tem duas vagas para orientar um mestrado e um doutorado. Esses trabalhos devem se alinhar aos assuntos de sua especialidade: jornalismo como profissão: perfil profissional, identidade e condições de trabalho; teoria do jornalismo – jornalismo como forma social de conhecimento; e crise no jornalismo e sustentabilidade do negócio jornalístico.
Eu tenho uma vaga para doutorado, e meus temas de interesse de orientação são: ética jornalística; crise no jornalismo; transparência no jornalismo e media accountability; privacidade, e credibilidade jornalística.
A seleção tem três etapas, todas a distância por causa da pandemia: análise de currículo e projeto, prova escrita, e entrevista. O prazo de inscrição vai até 13 de março.
Não quer aproveitar?
O que se pode dizer do futuro do jornalismo local?
O pesquisador Giovanni Ramos lidera o Dialéticas, podcast de divulgação científica que se mergulha em temas de jornalismo e comunicação. Emitido a partir da Universidade da Beira-Interior (UBI), de Portugal, o Dialéticas debateu futuros e impasses para o jornalismo local. Participei com Jacques Mick e Samuel Lima. Falamos longamente sobre o projeto GPSJOR, que consumiu seis anos de nossas vidas de pesquisadores…
A conversa rendeu dois episódios do podcast, e o primeiro já pode ser conferido aqui; o segundo será publicado dia 24…
ATUALIZAÇÃO: O segundo episódio acaba de sair. Aqui!
Que impactos terá a eleição de Lula para o jornalismo?
Esse clima de já-ganhou pode dar mais tempo para as redações se perguntarem sobre que efeitos terá a eleição de Lula para o jornalismo brasileiro. Será que o Lula-lá vai recalibrar as coberturas?
Escrevi sobre isso para o BemDito.
Ética e desinformação: um debate
No finalzinho de janeiro, debati ética jornalística, desinformação e outros temas afins com meu amigo e companheiro Samuel Lima . O vídeo, na verdade, é uma entrevista que demos para os colegas do Observatório Internacional Estudantil da Informação (ObservInfo), da UnB.
Veja aqui:
Observatórios de imprensa e desinformação
Sou um dos convidados do debate “Uma Rede contra a desinformação: o trabalho dos Observatórios”, que acontece amanhã (17), a partir das 19 horas. Esta é uma realização da Rede Nacional de Combate à Desinformação (RNCD), com transmissão pelo canal de Youtube da rede.
A proposta é reunir representantes de observatórios de mídia de diferentes regiões do país, e que são parceiros da RNCD Brasil, para compartilhar relatos sobre experiências, trabalhos e métodos de atuação, em especial num cenário de ampla desinformação e em que o trabalho dos observatórios pode contribuir para o entendimento dos modos de funcionamento dos sistemas midiáticos e subsidiar o desenvolvimento de políticas que garantam a pluralidade democrática.
O debate contará também com a participação do professor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e coordenador do Observatório da Mídia: direitos humanos, políticas, sistemas e transparência, Edgard Rebouças; da professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenadora do Observatório da Comunicação Pública (Obcomp), Maria Helena Weber; e do professor da Universidade Federal do Tocatins (UFT) e coordenador do Observatório de Pesquisas Aplicadas ao Jornalismo e ao Ensino (Opaje), Gilson Porto.
Sobre a RNCD
A Rede Nacional de Combate à Desinformação foi lançada em setembro de 2020 e reúne projetos e instituições de diversas naturezas que atuam de alguma forma para combater o mercado da desinformação. Participam da RNCD, coletivos, iniciativas desenvolvidas dentro de universidades, agências, redes de comunicação, projetos sociais, projetos de comunicação educativa para a mídia e redes sociais, aplicativo de monitoramento de desinformação, observatórios, projetos de fact-checking, projetos de pesquisa, instituições científicas e revistas científicas.
Baseada numa plataforma digital, a rede busca oferecer conteúdos de educação midiática, monitoramento de fake news, jornalismo de fact-checking e debunking, bem como ações de comunicação proativa levando informação precisa e necessária para a sociedade. O objETHOS integra a rede de parceiros da organização. Para saber mais sobre a RNCD, acesse rncd.org/
Quem vai financiar o jornalismo independente?
Amanhã, 3 de outubro, tem um debate muito bacana no Fala!, Festival de Comunicação, Culturas e Jornalismo de Causas, que acontece online de 1 a 8 de outubro: Quem vai financiar o jornalismo independente no Brasil?
Estarei com Daniele Moura (Jornal Maré Notícias), Elaine Silva (Alma Preta Jornalismo) e Rosenildo Ferreira (1PapoReto), que faz a mediação. A mesa acontece a partir das 10 horas, e pode ser acompanhada pelo canal de vídeos do festival.
O Fala! foi idealizado e organizado por quatro grupos de mídia independente – Alma Preta Jornalismo, Marco Zero Conteúdo, 1Papo Reto e Ponte Jornalismo, e tem apoio do Sesc.
As capas dos jornais neste 7 de setembro
Alguns dos diários brasileiros farejaram hoje os odores golpistas em suas primeiras páginas. Vale analisar, guardar e acompanhar. Nesta manhã do dia da independência, ainda é cedo para dizer o que pode acontecer, se algo mais grave e violento ou apenas cenas patéticas, alucinadas e reveladoras do charco em que o país mergulhou com aquele homem terrível.