A firmação anterior não é minha. Com um tom bem mais elaborado e rótulo científico, o psicólogo norte-americano Gary Marcus defende a idéia de que o cérebro não é lá um produto do design inteligente e que apresenta defeitos constantes que se refletem na nossa vida cotidiana.
A tese está no livro “Kluge” (gambiarra, em português) e hoje, o Mais! da Folha de S.Paulo traz uma entrevista com o cientista que já foi pupilo do também polêmico Steven Pinker.
Como a matéria é para assinantes, reproduzo um trechinho:
Engenheiros americanos costumam usar a gíria “kluge” ao se referirem a soluções improvisadas para problemas em projetos. A falta de iluminação numa casa nova pode rapidamente ser resolvida, por exemplo, com um fio desencapado, uma lâmpada velha, uma extensão e esparadrapo. Esse tipo de gambiarra, diz o psicólogo Gary Marcus, da Universidade de Nova York, é também a melhor analogia para descrever a mente humana.
“Kluge” é o título do novo livro de Marcus, dedicado a mostrar como nossas faculdades mentais mais caras -consciência e raciocínio lógico- foram construídas pela evolução aproveitando estruturas cerebrais primitivas, na falta de algo melhor. Dá para o gasto, mas o preço que pagamos por não sermos fruto de um “projeto inteligente” é que nossa gambiarra cerebral freqüentemente entra em curto-circuito.
Auto-engano, teimosia, presunção -e crenças religiosas- seriam todos efeitos colaterais da forma como a mente é estruturada. Nossa memória, também, parece ser ótima para um caçador identificar pegadas de animais, mas não muito para guardar senhas de banco.
Analisando suas teorias à luz de experimentos psicológicos, Marcus mostra o quanto somos capazes de violar a racionalidade que supostamente é a marca registrada do Homo sapiens, o homem que sabe. Em um fenômeno conhecido como “ancoragem e ajuste”, por exemplo, o cérebro é normalmente induzido por valores arbitrários -o autor descreve um experimento no qual números que saíam numa roda da fortuna influenciavam voluntários a responder uma questão não-relacionada, como “qual é a porcentagem de países africanos na ONU?”
Outro fenômeno analisado por Marcus a chamada “preparação”, ou indução subliminar. As pessoas tendem a responder a perguntas sobre suas vidas com mais otimismo depois de assistir a “Os Smurfs” do que a “O Ladrão de Bicicletas”.
Diante disso, Marcus acusa seu próprio professor Steven Pinker -o papa da psicologia evolutiva- de superexaltar o cérebro humano como um órgão perfeitamente adaptado.