Enfim, uma lei de proteção de dados brasileira!

Foi sancionada ontem a Lei Geral de Proteção de Dados, instrumento que vai ajudar a regular a interceptação, uso, armazenamento e compartilhamento de dados pessoais no Brasil. A lei já era esperada há muito tempo porque os dados hoje são uma moeda cada vez mais importante na economia global. Não tem a ver só com dinheiro. Tem a ver com privacidade, transparência, liberdade e autonomia dos usuários e cidadãos. Todos precisam de segurança jurídica em meio à vida conectada!

O Brasil estava atrasado nesse caso. Mais de 120 países já tinham regras para o setor.

É uma vitória da sociedade, mas o texto sancionado ontem por Michel Temer teve vetos importantes, e o maior deles é com relação à criação de uma autoridade nacional para fiscalizar o setor. Temer ignorou especialistas, empresas de tecnologia, órgãos de defesa do consumidor, ativistas e até mesmo o Comitê Gestor da Internet, que pediam que o texto aprovado na Câmara e Senado fosse sancionado sem vetos.

A lei foi publicada hoje no Diário Oficial da União. Veja aqui.

Para entender os vetos, veja aqui e aqui.

O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) já tem uma avaliação do impacto dos vetos e manifestou preocupação.

O que acontece agora?

  1. A sociedade precisa batalhar pela criação de uma autoridade de dados. Sem ela, a lei é frouxa, manca, caolha… O Poder Executivo pode mandar um projeto de lei ou uma medida provisória para a Câmara. A segunda alternativa é mais rápida, principalmente em ano eleitoral.
  2. A lei passa a vigorar daqui a um ano e meio, em 2020.
  3. A lei complementa o Marco Civil da Internet no que se refere a dados pessoais. Empresas, governos e cidadãos vão precisar se adequar às novas normas. Isso é bom para o usuário, principalmente, que estava totalmente descoberto legalmente nesse assunto.

Regulação econômica da mídia na Câmara

Será que agora vai?

(Reproduzido do FNDC)

Duas propostas importantes para a democratização da comunicação no Brasil serão discutidas em audiência pública na Câmara dos Deputados na próxima semana (7/5): os projetos de lei (PL) 4026/2004, de autoria do ex-deputado Cláudio Magrão (PPS-SP), e 6667/2009, proposto pelo deputado Ivan Valente (Psol-SP). Ambos regulamentam a Constituição Federal (Art. 220), impondo limites à propriedade dos meios de comunicação e à audiência para combater o monopólio no setor, e tramitam apensados.
A audiência foi requerida pela deputada Luiza Erundina em março e será realizada às 9h30 da próxima quinta-feira (7/5), no plenário 13 do anexo II da Câmara. O ministro Ricardo Berzoini, das Comunicações, é um dos convidados, junto com Ana Carolina Lopes de Carvalho, assessora da presidência do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Murilo Cesar Ramos, professor da Universidade de Brasília (UnB) e Rosane Bertotti, Coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC).
O PL 4026/2004 altera o Decreto-Lei 236/67 e limita em no máximo 50% a audiência de uma mesma rede de televisão (em qualquer horário). Esse limite já é realidade em países como os Estados Unidos, onde uma única empresa de comunicação não pode ter mais que 39% da audiência da população em território nacional. A proposta também estabelece limites à propriedade de emissoras por empresas de rádio.
Na justificativa do projeto, o autor observa que o Decreto-Lei 236 tem quase meio século e refletia uma realidade em que as emissoras operavam isoladamente ou formavam pequenas redes, o que não acontece hoje. A ideia é “pensar em alguma forma de administrar essa situação, delimitando o poder de mercado dessas empresas”.
O PL também estabelece suspensão das outorgas de retransmissoras e repetidoras que excederem o índice de audiência estipulado, o que que caracteriza domínio de mercado relevante, nos termos do Art. 20, inciso II, da Lei 8.884/94 (lei do Cade – Conselho Administrativo de Defesa Econômica). O PL foi desarquivado pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados em fevereiro deste ano.
A proposta do deputado Ivan Valente (PL 6667/2009) responde à demanda da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) por políticas públicas capazes de coibir o monopólio e o oligopólio no setor de radiodifusão. O projeto tipifica a concentração horizontal e vertical nos meios de comunicação, proíbe que empresas do setor tenham acionistas ou cotistas integrantes de empresas de jornais, revistas e outros periódicos impressos, de empresas de televisão por assinatura ou de telecomunicações, além de estabelecer limites para a propriedade de emissoras de rádio e TV.
Bia Barbosa, coordenadora de Comunicação do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) comemora a realização da audiência. Para ela, a iniciativa demonstra que a despeito do desinteresse dos empresários do setor em discutir a concentração, “por interesses óbvios”, e da lentidão do governo em fazer a discussão avançar, as entidades sociais organizadas em prol da democratização da comunicação não param de cobrar que o poder público abra um espaço para fazer esse diálogo com a sociedade. “Nossa constituição proíbe o monopólio, mas até hoje não foi colocada em prática, por isso temos que debater esse tema sem melindres”, defente.
Conheça as propostas
Autor: ex-deputado Cláudio Magrão (PPS-SP)
Dispõe sobre os limites à concentração econômica nos meios de comunicação social, e dá outras providências.
Autor: Ivan Valente (PSOL-SP)
Estabelece limites para a propriedade de empresas de comunicação social, proíbe a propriedade cruzada nos meios de comunicação, e dá outras providências.

imprensa e judiciário, um evento

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aprovaram o marco civil da internet!

Close-up-of-explosion-of-champagne-bottle-cork2Depois de dois anos de discussão, de quase de uma dezena de adiamentos de votação pelos parlamentares, de denúncias de espionagem internacional de governos e empresas, de chantagem do PMDB e de trancamento da pauta, o Congresso Nacional fi-nal-men-te aprovou o texto do Marco Civil da Internet, um documento histórico para as relações de usuários, organizações e infra-estrutura tecnológica.

O texto agora vai para o Senado e, se não sofrer modificações, segue para a sanção presidencial. Depois, vira lei com a publicação no Diário Oficial da União.

Se tudo correr como o esperado, Dilma Rousseff terá nas mãos um belo trunfo para apresentar na Conferência Global sobre Governança da Internet, que o Brasil sedia em abril.

Detalhe da aprovação do Marco Civil: a votação foi simbólica e apenas o PPS não quis votar o texto. Arranjou uma desculpa qualquer para não ter que votar com o governo, a quem não se cansa de espancar verbalmente.

Vou te contar, viu!…

governo deu pra trás!

As coisas azedaram definitivamente entre o governo federal e as entidades da sociedade que lutam pela democratização dos meios de comunicação. Veja a nota oficial lançada pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, o FNDC:

A declaração do secretário-executivo do Ministério das Comunicações, no último dia 20, de que este governo não vai tratar da reforma do marco regulatório das comunicações, explicita de forma definitiva uma posição que já vinha sendo expressa pelo governo federal, seja nas entrelinhas, seja pelo silêncio diante do tema.

A justificativa utilizada – a de que não haveria tempo suficiente para amadurecer o debate em ano pré-eleitoral – é patética. Apesar dos insistentes esforços da sociedade civil por construir diálogos e formas de participação, o governo Dilma e o governo do ex-presidente Lula optaram deliberadamente por não encaminhar um projeto efetivo de atualização democratizante do marco regulatório. Mas o atual governo foi ainda mais omisso ao sequer considerar a proposta deixada no final do governo do seu antecessor e por não encaminhar quaisquer deliberações aprovadas na I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em 2009. O que fica claro é a ausência de vontade política e visão estratégica sobre a relevância do tema para o avanço de um projeto de desenvolvimento nacional e a consolidação da democracia brasileira.

A opção do governo significa, na prática, o alinhamento aos setores mais conservadores e o apoio à manutenção do status quo da comunicação, nada plural, nada diverso e nada democrático. Enquanto países com marcos regulatórios consistentes discutem como atualizá-los frente ao cenário da convergência e países latino-americanos estabelecem novas leis para o setor, o Brasil opta por ficar com a sua, de 1962, ultrapassada e em total desrespeito à Constituição, para proteger os interesses comerciais das grandes empresas.

Ao mesmo tempo em que descumpre o compromisso reiterado de abrir um debate público sobre o tema, o governo federal mantém iniciativas tomadas em estreito diálogo com o setor empresarial, acomodando interesses do mercado e deixando de lado o interesse público.

No setor de telecomunicações, na mesma data, foi anunciado um pacote de isenção fiscal de 60 bilhões para as empresas de Telecom para o novo Plano Nacional de Banda Larga em sintonia com as demandas das empresas, desmontando a importante iniciativa do governo anterior de recuperar a Telebrás, e encerrando o único espaço de participação da sociedade no debate desta política – o Fórum Brasil Conectado. Somando-se ao pacote anunciado de benesses fiscais, o governo declara publicamente a necessidade de rever o texto do Marco Civil da Internet que trata da neutralidade de rede, numa postura totalmente subserviente aos interesses econômicos.

Na radiodifusão, faz vistas grossas para arrendamentos de rádio e TVs, mantém punições pífias para violações graves que marcam o setor, conduz a portas fechadas a discussão sobre o apagão analógico da televisão, enquanto conduz de forma tímida e errática a discussão sobre o rádio digital em nosso país. Segue tratando as rádios comunitárias de forma discriminatória, sem encaminhar nenhuma das modificações que lhes permitiriam operar em condições isonômicas com o setor comercial.

Diante desta conjuntura política e do anúncio de que o governo federal não vai dar sequência ao debate de um novo marco regulatório das comunicações, ignorando as resoluções aprovadas na 1ª Conferência Nacional de Comunicação, manifestamos nossa indignação, ao mesmo tempo em que reiteramos o nosso compromisso com este debate fundamental para o avanço da democracia.

De nossa parte, seguiremos lutando. A sociedade brasileira reforçará sua mobilização e sua unidade para construir um Projeto de Lei de Iniciativa Popular para um novo marco regulatório das comunicações.

Coordenação executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação – FNDC:

Associação das Rádios Públicas do Brasil – Arpub
Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária – Abraço
Associação Nacional das Entidades de Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões – Aneate
Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé
Conselho Federal de Psicologia – CFP
Central Única dos Trabalhadores – CUT
Federação Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações – FITTEL
Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão – Fitert
Intervozes – – Coletivo Brasil de Comunicação Social

Xiiiiii…

cláusula de consciência e um precedente jurídico

A notícia interessa a todos os jornalistas, pois pode criar uma jurisprudência brasileira para casos de violação à cláusula de consciência…

(reproduzido do site do Tribunal Superior do Trabalho. A dica é do professor Marcel Cheida)

Uma jornalista da Fundação Cultural Piratini Rádio e Televisão no Estado do Rio Grande do Sul (RS) será indenizada em R$ 10 mil por danos morais após a comprovação de ato de cerceamento da liberdade profissional por parte da Fundação. A decisão, por unanimidade, foi tomada pela Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que ao negar provimento ao recurso da Fundação manteve a condenação imposta pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS). A Fundação opera uma emissora pública de televisão, a TV Educativa (TVE) do Rio Grande do Sul.

A jornalista em sua inicial narra que foi escalada para fazer uma matéria para a TVE sobre a troca da direção da Secretaria de Transparência do Estado do Rio Grande do Sul. Na matéria seriam entrevistados o recém-nomeado para o cargo e a secretária demissionária. A jornalista destacou que a ex-secretária, ao pedir demissão, havia criticado publicamente o Governo do Estado por este não haver estruturado a Secretaria. As críticas segundo a jornalista foram amplamente divulgadas pela imprensa gaúcha à época.

Após pronta a reportagem sobre a troca de secretários, a jornalista foi informada que sua matéria não seria veiculada e que estaria afastada, a partir daquela data, do jornalismo político, sendo proibida a sua presença no Palácio Piratini, sede do governo gaúcho.

O fato segundo a jornalista repercutiu em toda imprensa gaúcha. O presidente da TVE a época ao ser perguntado sobre os fatos que levaram a jornalista a ser afastada do jornalismo político, acusou-a de “não possuir “padrão técnico” para trabalhar na reportagem política”. A jornalista se refere ao fato como “inacreditável”, já que possuía mais de 15 anos de experiência na área, era concursada e especializada em televisão pela Universidad de Alicante, na Espanha e formada em Documentários para televisão pela Universty of London e Westminster University, ambas no Reino Unido.

Diante dos fatos a jornalista afirmou estar sendo alvo de intimidações e constrangimentos, externados através de humilhações e da proibição de livre exercício da sua profissão. Pedia indenização no valor de R$ 45 mil por danos morais.

A 17ª Vara do Trabalho de Porto Alegre negou o pedido da jornalista. Na sentença o juízo observa que os fatos narrados pela jornalista de fato ocorreram, porém não ficou comprovado que estes tenham atingido de forma negativa sua intimidade, honra ou imagem. O Regional entretanto reformou a sentença e condenou a Fundação por danos morais em R$ 10 mil acrescidos de juros. Para o Regional a prova testemunhal provou o dano causado à dignidade profissional da jornalista, caracterizado através da entrevista do então presidente da TVE.

A Fundação diante da condenação recorreu por meio de recurso de revista ao TST. O seguimento do recurso foi negado pela vice-presidente do TRT da 4ª Região que não constatou a ocorrência de violação a dispositivo de lei ou da Constituição Federal que autorizassem o exame pelo TST. Com isto a Fundação ingressou com o agravo de instrumento agora julgado pela Turma.

Na Oitava Turma a relatora ministra Dora Maria da Costa negou o pedido da Fundação sob o fundamento de que o Regional havia fixado corretamente o valor da condenação, observando a culpa e o porte econômico da jornalista e da Fundação, bem como a proporcionalidade em relação a extensão do prejuízo. A ministra salientou ainda que os acórdão trazidos no recurso para o confronto de teses são inservíveis, por não tratarem dos mesmos fatos que são discutidos no recurso.

(Dirceu Arcoverde/RA)

Processo: AIRR-8600-11.2009.5.04.0017

O TST possui oito Turmas julgadoras, cada uma composta por três ministros, com a atribuição de analisar recursos de revista, agravos, agravos de instrumento, agravos regimentais e recursos ordinários em ação cautelar. Das decisões das Turmas, a parte ainda pode, em alguns casos, recorrer à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1).

o ai-5 digital em debate na “politics”

Recebi esta semana a edição impressa da revista poliTICs, editada pelo Nupef e com apoio da Fundação Ford. O tema deste número de agosto é a chamada Lei Azeredo, projeto de Lei Sobre Crimes de Informática (PL 84/99), apontado por ciberastivistas como um “Cavalo de Troia” legislativo. O tema é polêmico e os textos da edição são vitais para a compreensão e discussão do assunto.

Vejam o sumário:

A internet e o novo Cavalo de Troia – Sergio Amadeu da Silveira

Nomeação de domínios na internet – Avri Doria

Os guerreiros dos Dados Abertos estão lutando a favor de Robin Hood ou do xerife? – Michael Gurstein

A febre dos princípios da internet – Wolfgang Kleinwächter

Quer a melhor notícia? Você pode conferir tudo isso de graça e pela internet.
direito à fonte!

acesso a informações públicas, um guia

O Senado Federal aprovou na terça-feira (25/10) o projeto de lei de acesso à informação, oito anos após a primeira proposta ter sido apresentada ao Congresso Nacional.

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), uma das organizações que mais articularam para a aprovação da nova regra, produziu um guia que ajuda a traduzi-la. Veja aqui.

o direito a saber: um novo livro

A Unesco acaba de lançar um resultado da sua conferência mundial do dia da liberdade de imprensa, de 3 de maio de 2010: o livro Freedom of Information: The right to know (Liberdade de Informação: o direito a saber). A publicação trazas principais falas de autoridades sobre o tema no evento, além de relatos regionais que tratam das pressões sobre o trabalho dos jornalistas, o estado da liberdade de expressão nos países e seus suportes jurídicos e institucionais. Há textos da Australia, Papua Nova Guiné, Canadá, Nigéria, Nepal, Índia, Indonésia, África do Sul, Áustria, Ruanda, Somália, Ilhas Fiji e Chile.

Chama a atenção o capítulo “Transparência, accountability e a luta contra a corrupção: para além das leis de liberdade de informação”. Os deputados catarinenses que se queixaram do Deputadômetro e provocaram sua suspensão deveriam ler o documento, que tem 1,2 Megabites, 141 páginas em formato PDF e em inglês.

autorregulação de jornais é positiva, mas insuficiente

A Associação Nacional dos Jornais (ANJ) alterou seu estatuto e lançou o seu programa permanente de autorregulamentação, com a indicação de boas práticas para as empresas do setor.

A ideia foi bem recebida por setores acadêmicos, mas é pouco, conforme se pode ler na reportagem que Gilberto Costa fez para a Agência Brasil.

ma che justiça é essa?

Em Florianópolis, a Tim teve 233 queixas não respondidas no Procon este ano. A operadora também tinha recebido oito multas e não pagou nenhuma. Aí, o Procon foi lá e determinou que a operadora não poderia ter a adesão de nenhum novo cliente por 48 horas. Mesmo assim, a Tim desobedeceu: vendeu um chip para um fiscal do Procon, que não se identificou. Aí, o Procon foi e multou a Tim em R$ 1 milhão. A mídia e a população adoraram a medida. A Tim entrou com pedido de liminar e um juiz deu o que operadora pediu. Segundo o juiz, o Procon foi exagerado.

Então, tá!

lei de acesso à informação avança

(Reproduzido de Artigo 19)

Brasília, 20.04.2011. Ontem, em sessão conjunta de duas comissões, senadores aprovaram pareceres favoráveis ao projeto de lei que regulamenta o direito à informação no Brasil. A proposta ainda precisa passar por mais uma comissão, mas o governo trabalha para que ela seja enviada rapidamente ao Plenário para aprovação.

“O projeto é um marco positivo para o desenvolvimento do direito à informação no Brasil”, afirma Agnès Callamard, diretora executiva da ARTIGO 19. “Nós saudamos os esforços do governo brasileiro de buscar acelerar a tramitação do projeto. O país enviaria uma mensagem muito positiva ao mundo se a proposta fosse aprovada antes do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, em 3 de maio.”

Originalmente, a sessão conjunta entre a Comissão de Direitos Humanos e a Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado previa a participação da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Mas as articulações com a comissão presidida por Fernando Collor de Mello (PTB-AL) não avançaram, e o projeto (PLC 41/2010) ainda precisará passar por sua revisão.

O projeto de lei em tramitação no Senado é um substitutivo do texto enviado pela Casa Civil à Câmara dos Deputados em 2009, quando foi discutido e emendado pela sociedade civil e deputados. A presidente Dilma Rousseff esteve diretamente envolvida na elaboração do texto original e já manifestou seu apoio a uma aprovação célere do projeto pelo Senado.

O projeto de lei prevê a criação de procedimentos para facilitar e garantir o acesso a informações públicas mantidas por autoridades públicas. Ele inclui o treinamento de servidores públicos, sanções ao desrespeito à lei, obrigações de divulgação pró-ativa de informações de interesse publico e campanhas de conscientização. A regulamentação do direito de acesso à informação pública é uma tendência mundial, com mais de 90 países tendo aprovado leis de liberdade de informação.

transparência na alesc e jornalismo watchdog

Reportagem do Diário Catarinense desta semana, assinada por Upiara Boschi, apontou que a Assembleia Legislativa do estado é das menos transparentes do país. A matéria, com chamada na capa da edição de domingo, 27, denuncia que no site da Alesc não estão disponíveis dados como assiduidade dos deputados, gastos em viagens e outras informações de interesse dos cidadãos.

Pois a reportagem teve efeito imediato. No início da semana, o presidente da Alesc, Gelson Merísio, apressou-se a anunciar numa coletiva que o Legislativo estava trabalhando num novo site, mais informativo. Quem acompanha o caso sabe que não foi apenas a matéria dominical que provocou essa reação. Na semana passada, outras matérias já questionavam viagens de parlamentares à China, sendo que mal se sabia dos motivos, dos custos, dos resultados e pior: um dos deputados viajantes é diretamente interessado na prosperidade dos negócios com aquele país, já que atua no setor de comércio exterior…

Esse quase cerco à Alesc traz à tona duas questões: deveres dos órgãos públicos e funções da imprensa. Nas democracias recentes, é cada vez mais invocado o princípio da transparência, e por isso gestores públicos e representantes da população precisam prestar contas do que fazem e do que deixaram de fazer. É um princípio constitucional, democrático, moderno, republicano, e que tende a se universalizar. Os norte-americanos têm uma palavra para isso: accountability. Nas palavras de um velho ditado: não basta que a mulher de César seja honesta; ela precisa também parecer honesta.

Diretamente ligado ao dever dos órgãos públicos está uma função do jornalismo: fiscalizar os poderes, acompanhar seus passos e informar à população o que está certo e o que não está. Os norte-americanos também um nome para esse tipo de prática: watchdog journalism. Numa tradução aproximada: jornalismo cão-de-guarda. Não se trata de um jornalismo pittbul que ataca a todos, mas de um jornalismo que resguarda, assegura, vigia os interesses da coletividade.

Por isso, o novo site da Alesc é bem vindo, sim. Assim como são bem recebidas as reportagens que seguem as sombras dos poderes. Jornalistas e políticos, mesmo que muito diferentes, deveriam se guiar por valores semelhantes: o bem comum, a vontade coletiva, o interesse público. Seria muito bom se fosse sempre assim. Seria…

conselho de jornalismo retorna

(reproduzido de O Povo)

A Câmara dos Deputados vai retomar a discussão do projeto que cria o Conselho Federal de Jornalismo, órgão que teria entre suas atribuições fiscalizar a atuação dos jornalistas, com poder para aplicar sanções.

O projeto havia sido arquivado com o fim da legislatura passada, mas voltará à pauta devido a um pedido do deputado Sandes Júnior (PP-GO).

O deputado pediu o desarquivamento de uma proposição sua que restabelece a obrigatoriedade do diploma para os jornalistas.

Como o projeto dele estava anexado a outros que tratam de temas correlatos, todos que haviam sido engavetados voltaram à pauta.

“Minha preocupação é com meu projeto, mas a regra acabou por desarquivar o outro também. Vou pedir ao relator (ainda a ser indicado) para desconsiderar o projeto do conselho”, afirmou Júnior. O relator, no entanto, pode acatar ou não a sugestão.

O texto sobre o Conselho Federal que será analisado é de autoria do ex-deputado Celso Russomano (PP-SP) e estabelece um Código de Ética que definirá “deveres ético-profissionais do jornalista, as infrações disciplinares e as respectivas sanções”.

Desde 1984 os deputados tentam criar um conselho nos moldes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para regular a profissão de jornalista. Já foram cinco tentativas nesse sentido.

democracia e regulação: uma revista

Só pra lembrar…

A revista Estudos em Jornalismo e Mídia, do PosJor/UFSC, está com chamada de textos para sua primeira edição de 2011.
O núcleo temático é Democracia e Regulação da mídia, veja a ementa:

Um dos temas mais discutidos nos últimos meses tem sido a estrutura dos meios de comunicação e a natureza da organização do mercado midiático brasileiro. Movimentos vindos de organizações não-governamentais, da academia e até mesmo do governo federal têm sinalizado para a necessidade de a sociedade discutir novas regras para o setor. Até mesmo uma importante organização do mercado – a Associação Nacional dos Jornais – manifestou a disposição para a autorregulação.
Diante desse cenário, a primeira edição da revista Estudos em Jornalismo e Mídia de 2011 objetiva discutir as complexas relações entre democracia e regulação do mercado de mídia.
Será priorizada a análise de artigos que tratem de temas como: políticas de comunicação no Brasil; marcos regulatórios no setor; regulaçã o, regulamentação e autorregulamentação dos meios; concentração de mídia; propriedade cruzada; relações entre meios de comunicação e grupos políticos; comparativos entre as legislações de mídia no Brasil e outros países; limites operacionais em meios audiovisuais e internet; órgãos de regulação; proteção da concorrência; mudanças estruturais no jornalismo a partir de marcos regulatórios; liberdade de imprensa, democracia e cidadania.

Deadline: 20 de abril de 2011
Publicação: Junho de 2011

A equipe editorial avisa que os artigos já encaminhados estão em fase de avaliação, e que novos textos podem ser mandados até a data limite. Prioridade de avaliação para as colaborações que abordem o tema Democracia e Regulação.

Estudos em Jornalismo e Mídia existe desde 2004, é semestral, e circula exclusivamente em meioi eletrônico. No sistema de avaliação Qualis/Capes, é uma publicação B3.

 

liberdade de expressão e auto-regulação

A Unesco promove hoje e amanhã em Paris um amplo seminário que vai discutir liberdade de expressão e auto-regulação na Europa. O evento vem sendo anunciado com alarde desde o ano passado e avança nos empreendimentos da organização no debate sobre segurança dos jornalistas, liberdade da internet, liberdade de imprensa no mundo e marcos regulatórios para a mídia em diversas partes.

Por questões operacionais, a Unesco dividiu o seminário em dois eventos seguidos:

Simpósio Internacional sobre Liberdade de Expressão

Conferência sobre ética jornalística e auto-regulação na Europa: novas mídias, velhos dilemas

 

observatório apoia regulação de publicidade

Reproduzo mensagem do professor Edgard Rebouças, coordenador do Observatório da Mídia Regional:

Observatório assina carta de apoio à Anvisa

O Observatório da Mídia Regional: direitos humanos, políticas e sistemas, grupo de pesquisa e ação da UFES, é uma das 41 entidades que a assina a carta de apoio à regulamentação da publicidade de alimentos. A correspondência foi enviada no último dia 19 de novembro para vários órgãos da Justiça brasileira e entidades do governo, tendo em vista que desde setembro uma liminar da Justiça Federal suspendeu a aplicação da Resolução nº 24 da Anvisa, publicada em junho. Pela resolução, a partir do final de dezembro as publicidades de produtos alimentícios deverão trazer alertas quanto aos malefícios à saúde.

As entidades nacionais e internacionais que assinam a carta são ligadas principalmente aos setores de saúde, comunicação e direitos humanos. O objetivo é que a Justiça Federal reveja a decisão que privilegia apenas os interesses empresariais, em detrimento às questões de saúde, principalmente em relação à obesidade e a influência sobre as crianças.

No próximo dia 17, o coordenador do Observatório da Mídia Regional, Prof. Dr. Edgard Rebouças, participará de uma mesa redonda na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo para aprofundar os debates sobre o tema. No mesmo dia será criada a “Frente pela regulação da publicidade de alimento”.

Para ler a íntegra da Carta à Justiça Federal, acesse: http://www.ufes.br/observatoriodamidia

 

ainda sobre a liberdade de imprensa no brasil

Disse há pouco que o perigo maior à liberdade de imprensa e de expressão no país tem vindo muito mais dos tribunais do que dos palácios dos governos. Isto é, o Judiciário impede e cerceia mais o exercício profissional dos jornalistas e a difusão livre da informação que o Poder Executivo.

Os dados, os números mostram isso.
Veja o que diz matéria do Portal Imprensa sobre um relatório divulgado nesta semana pela Associação Nacional de Jornais (ANJ):

… a imprensa brasileira teria sofrido 70 atentados contra a liberdade de informação nos últimos dois anos. (…) O relatório da entidade destaca os números de ordens judiciais impondo censura aos meios de comunicação: dos 70 casos, 26 se referem a decisões do Poder Judiciário, além da determinação de 10 medidas restritivas pela Justiça Eleitoral. A ANJ ressalta, ainda, o aumento da quantidade de decisões judiciais que proíbem jornais de divulgar matérias sobre determinados temas ou conteúdo, seja em período eleitoral ou não. Durante o período do levantamento, o Comitê de Liberdade de Expressão denunciou 20 casos de censura, segundo a entidade.

Trocando em miúdos, o documento aponta que de agosto de 2008 a julho de 2010, houve uma morte, três prisões, 18 casos de agressão, 20 casos de censura, cinco atentados, oito casos de abuso, entre outras ocorrências.

Quer conferir o relatório? Clique aqui.
(62 páginas, formato PDF, 878 Kb)
(Vá direto ao ponto: pule as primeiras 36 páginas do relatório…)

direitos autorais em discussão: propostas

Embora este seja um assunto que me interessa bastante, pouco tratei neste blog da consulta pública que o governo federal fez nos últimos meses sobre reformas na lei de direitos autorais. A escassez de tempo e meus (des)conhecimentos de direito me impossibilitaram de escrever aqui algo que se justificasse.

No entanto, tem gente mais séria por aí. É o caso do Grupo de Estudos em Direito Autoral e Informação (GEDAI), vinculado ao Curso de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. Uma referência regional e nacional para esta discussão, o grupo vem promovendo debates (em junho e julho) e sistematizou um documento com “os principais resultados obtidos, sistematizados e com as devidas justificativas, na forma solicitada pelo MinC para a consulta pública”.

O documento é importante também para quem pretende vir a Florianópolis para o 4º Congresso de Direito de Autor e Interesse Público, que acontece neste mês e que dei mais informações aqui.

justiça espanhola libera geral: compartilhamento não é pirataria

Reproduzo notícia que li no Observatório do Direito à Comunicação:

Um juiz de Barcelona decidiu que o blogueiro Jesus Guerra Calderon é inocente das acusações de violação de propriedade intelectual que lhe fizera a Sociedade Geral dos Autores e Editores da Espanha. O site de Jesus Guerra Calderon, o Elrincondejesus.com, divulga links para downloads de músicas e filmes através de sistemas de partilha de arquivos, como o eMule ou o Bit Torrent, os chamados sistemas peer-to-peer (P2P).

O processo contra Jesus Calderon, dono de um pequeno bar nos subúrbios de Barcelona, foi movido pela Sociedade Geral dos Autores e Editores da Espanha há três anos. Esta entidade é responsável pela gestão e proteção dos direitos de autor e representa mais de 90.000 membros de áreas tão distintas como a indústria cinematográfica, música ou literatura. A SGAE é ainda o rosto de mais de 150 das maiores empresas do mundo na área de conteúdos. Agora, a Justiça espanhola decidiu que o site não viola a Lei de Propriedade Intelectual.

A sentença vai mesmo ao fundo da questão, afirmando que os sites de links como o Elrincondejesus.com limitam-se a oferecer a possibilidade de fazer downloads através do P2P, mas “não supõe nem a distribuição, nem a reprodução, nem a comunicação pública das obras sujeitas a propriedade intelectual, pois é um mero índice que facilita a busca em redes de intercâmbio de arquivos P2P através do sistema de menus, cartazes ou capas com títulos de filmes ou obras musicais.”

A sentença vai ainda mais longe e afirma que “o sistema de links constitui a própria base da internet e uma multidão de páginas e sites de busca ( como o Google) permitem tecnicamente fazer aquilo que precisamente se pretende proibir neste procedimento, que é linkar as redes P2P”

A sentença foi classificada como “histórica” pelo advogado do acusado, Carlos Sánchez Almeida, e rebate assim os argumentos da SGAE, que acusava Jesús Guerra de infringir a Lei de Propriedade Intelectual por explorar obras sem ter os direitos de fazê-lo, reproduzi-las e fazer comunicação pública delas.

Segundo o El País, há hoje 34 processos penais contra sites que distribuem links ou disponibilizam arquivos para download.

A decisão vai também no sentido oposto ao que foi seguido recentemente na França, que aprovou uma lei contra a pirataria que prevê cortes de acesso à internet e multa em até 300 mil euros quem descarregue ficheiros de conteúdo denominado “ilegal”.

a quem interessa um jornalismo fraturado?

Enganou-se redondamente quem pensava que uma decisão do Supremo Tribunal Federal resolvesse por completo as questões mais importantes do jornalismo como profissão. A sentença que fez cair a obrigatoriedade do diploma na área para a obtenção de registro profissional não sepultou a questão, e só permitiu mais visibilidade às muitas fraturas que ajudam a compor essa combalida categoria. Hoje, passados oito meses do veredicto do STF, as fissuras são tantas que nem mesmo as entidades que poderiam atuar como pontos de aglutinação conseguem algum sucesso.

Talvez em poucos momentos os jornalistas tenham estado tão desunidos e divergentes

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) lidera uma campanha pela valorização da formação profissional e orienta seus 31 sindicatos filiados a trabalharem nesse sentido. Os sindicatos aquiescem e fazem figurar banners em seus websites, enaltecendo a importância dessa formação. No entanto, já há sinais evidentes de que há furos no barco. O Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina, por exemplo, já admite a sindicalização de não-diplomados. O Sindicato de São Paulo sinaliza que pode fazer o mesmo, e deve decidir sobre isso no dia 1º de abril.  No Espírito Santo, o sindicato não aceitou a proposta e se nega a receber não diplomados entre os seus quadros.

No caso catarinense, a decisão é altamente contestável, já que o assunto não passou pelo crivo da categoria em assembleia, tendo sido discutido só entre os diretores. Este é um tema político ou administrativo? É uma decisão cartorial que se move por consequentes dividendos de novos filiados ou é um movimento político para fragilizar a presidência da Fenaj, exercida pelo também catarinense Sérgio Murillo de Andrade? Difícil responder, já que as decisões dessa diretoria são tão transparentes…

A confusão se espalha

Mas a fragmentação no campo do jornalismo vai para além do movimento classista. Em diversos estados, as incertezas são tantas que se corre de um lado para o outro. A Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, por exemplo, aprovou projeto de lei que obriga jornalistas que servem em órgãos públicos estaduais a terem diplomas na área. Em Roraima, projeto semelhante foi aprovado na Assembleia. No Amazonas, os deputados estaduais vetaram projeto do tipo, e em Mato Grosso do Sul, a Comissão de Constituição, Justiça e Redação da assembleia local deu sinal verde para a tramitação de um projeto de lei análogo.

Há projetos de emendas constitucionais que resgatam a obrigatoriedade do diploma tramitando na Câmara Federal e no Senado. Há divisões cada vez mais evidentes na categoria. Há divergências entre as unidades sindicais. Há cursos de Jornalismo fechando no país. Essas circunstâncias ajudam a compor um cenário complexo e emblemático na história da consolidação do jornalismo como uma profissão. É evidente que a falta de unidade fragiliza a categoria e não ajuda a sociedade a melhor compreender o jornalismo, sua natureza e suas atribuições. É evidente também que há flagrantes choques de interesses dentro e fora da categoria. Há quem adore ver o circo pegar fogo. Pior: há quem ache que se beneficia com isso. Mas ninguém lucra com um jornalismo fragmentado. Nem mesmo a classe empresarial, que poderia colher frutos com uma categoria dividida.

Numa lógica imediatista, os empregadores podem ganhar mais força nas negociações trabalhistas, pois enfrentariam oponentes em frangalhos. Mas numa lógica mais perene, apostar na deterioração da profissão é contribuir para o enfraquecimento do jornalismo como negócio e como atividade social. Sem auto-estima, sem contornos profissionais bem definidos, sem profissionais que nele acreditem, o jornalismo vai mal. Se se apresenta hesitante, o jornalismo não serve à sociedade, não interessa ao cidadão comum e, portanto, não encontra meios de se sustentar como prática de negócios.

E a saída?

Apostar no ocaso do jornalismo, no embaçamento das fronteiras entre a profissionalidade e o amadorismo, e na fragmentação dos profissionais que dele vivem, volto a dizer, não beneficia a ninguém. Nesta guerra, não há vencedores no seu final.

Onde está a luz no fim do túnel? Na busca razoável por redefinições para o jornalismo. A decisão do STF é uma solução jurídica para um impasse permanente na área. Mas essa saída jurídica não resolveu os problemas da categoria, só precipitou mais dissonância e incerteza. Se aprovadas, as propostas de emenda constitucional podem ressuscitar a exigência do diploma, mas não vão enterrar a discussão em torno da qualidade da formação desses profissionais, da sua necessidade e da sua efetiva colaboração para um jornalismo melhor. Se aprovada, uma PEC dessas é mais uma solução legal, mas não total.

A meu ver, a solução total conjuga esforços jurídicos, de marcos regulatórios, mas também culturais e políticos. É necessário discutir e discutir e discutir o que constitui o jornalismo hoje nas sociedades complexas. É necessário repensar funções sociais e políticas para o jornalismo no jogo da contemporaneidade. É inadiável enfrentar a crise de identidade (e não financeira) do jornalismo. Sem isso, estaremos apenas adiando. Como quem deixa para a edição de amanhã a pauta de hoje…

direitos autorais: advogado avalia panorama das disputas judiciais

Ilustrado por Spacca para o ConjurEmbora seja um dos maiores experts brasileiros em Direitos Autorais, o advogado Amaro Moraes e Silva Neto recusa o rótulo de especialista. Ele se vê mais como um profissional que se dedica a questões que envolvem direito e tecnologia da informação, e em especial com casos de violação de direitos autorais na internet. Tudo porque, nos últimos anos, o próprio advogado tem percebido “dezenas de artigos seus” circulando pela rede sem qualquer menção ao autor.
Na entrevista a seguir, feita por email, Amaro Moraes e Silva Neto avalia como está sendo tratada essa que é uma questão cada vez mais estratégica e permanente na web: a autoria e os direitos de quem cria conteúdos.

No Brasil, muita gente move ações judiciais para garantir seus direitos nesta área? São artistas? Escritores? Jornalistas?
No que diz respeito a quem promove estas ações, estão presentes todos os segmentos sociais (artistas, escritores, jornalistas, advogados, etc.) Entretanto, fique ressaltado, o número de processos em trâmite é insignificante. Parece que as pessoas não estão se importando em serem furtadas em suas idéias.

Para termos uma ideia, uma ação ganha nas cortes daqui chega a propor o pagamento de que indenizações? Que reparações são pedidas?
Como já o disse um brilhante jurista brasileiro, Nelson Hungria, “a vida é variedade infinita e nunca se ajusta com irrepreensível justeza aos figurinos da lei ou às modas da doutrina”. No que diz respeito às indenizações por danos morais, deve ser esclarecido que somente cabe ao juiz a determinação do montante da indenização por danos morais.
Em 22 de agosto de 2000, a Coordenadoria de Editoria e Imprensa do Superior Tribunal de Justiça, veiculou notícia relativa ao Recurso Especial nº 114302/SP contra um Acórdão que condenou o pesquisador científico Carlos Augusto Pereira a pagar uma indenização de R$ 50 mil por danos morais à biomédica Yeda Lopes Nogueira, do Instituto Adolpho Lutz, a título de danos morais em razão do plágio perpetrado. No entanto, às indenizações por danos morais em razão plágio não são tão pródigas. No que diz respeito a danos materiais (inclusive lucros cessantes), estes serão reparados na razão direta de sua comprovação.

O senhor acha que a realidade brasileira é muito diferente de outros países quanto à disputa pela propriedade intelectual? Isto é, nossa legislação – sobretudo a Lei 9610/98 – tem dado conta dos casos? É avançada ou retrógrada?
Num mundo globalizado, de certo modo, tudo é muito parecido, eis que tudo atende, basicamente, a um único fator: o econômico. A legislação que criou a propriedade intelectual (uma aberração jurídica) atendeu aos interesses das mega-corporações que, de fato, dominam o planeta, não aos dos artistas que foram rebaixados a produtores culturais. Tecnicamente, não tenho o que criticar da lei dos direitos autorais. Mas este não é o ponto. O ponto é a aplicação da lei nos moldes dos anseios coletivos.

É claro que o advento da internet trouxe novos elementos para a esfera do direito autoral. Como vem reagindo os poderes Legislativo e Judiciário diante dessas modificações?
A internet não trouxe novos elementos para a esfera do direito autoral. A internet se prestou, como meio de divulgação exponencial, a criar conflitos neste meio. O resto é tudo igual.

Neste sentido, como senhor vê movimentos de flexibilização de direitos de autor, a exemplo das licenças do tipo Creative Commons, propostas pelo jurista Lawrence Lessig?
Acho fabuloso. Sempre fui partícipe desta posição desde 1996, quando criei um portal jurídico chamado Avocati Lócus, que não existe mais. Meus artigos eram assim disponibilizados. O que eu não admito é a omissão de texto ou, principalmente, a de meu nome como autor.

De que maneira isso tem modificado a tramitação de ações por aqui?
Em nada.

Tecnicamente, é mais fácil se identificar plágios em músicas do que em textos. A repetição de um conjunto de acordes caracteriza a cópia indevida. Isso não está muito definido em termos de textos. Em que bases se apoiam as cortes brasileiras para diferenciar um plágio de uma excessiva similaridade? Esses parâmetros são confiáveis?
Eu creio que na literatura é mais fácil se identificar o plágio do que na música. Em primeiro lugar pelo tempo ocupado por uma música e o ocupado por um texto. Menos elementos, mais facilidade. Mas, voltando à identificação do plágio literário, via de regra ele é literal… Alguns raros plagiadores tentam, no começo, dissimular a origem, mudando a ordem do parágrafo com a inversão de frases, substituindo algumas palavras por seus sinônimos e vai. Mas é fácil. Atualmente, existem programas que facilitam esta consulta.
Quanto às bases em que se apóiam as cortes, nos casos em que sou parte ou advogado sempre os julgadores se convenceram estribados nas atas notariais que noticiam os fatos. Trata-se de mera comparação. Quanto à sua confiabilidade, é indiscutível. Na verdade quem, ao tentar explicar (rememorando mais uma vez Nelson Hungria) que a distância mais curta entre dois pontos precisa recorrer aos geômetras da Quarta Dimensão, perdeu a convicção em si mesmo. Certas coisas são simples.

Por trás desses litígios está a ideia de “autoria”. A internet e seus usuários tem proposto novos regimes de autoria, como as compartilhadas e coletivas. Como o senhor observa a evolução desse conceito? Que futuro imediato temos para a produção autoral de conteúdo?
Em havendo acordo entre as partes quanto à exploração de uma idéia, comunitariamente, na verdade nada de novo ocorrerá. A legislação autoral já antecipa isto que se chama co-autoria. Quanto ao futuro imediato eu vejo um caminho sendo bastante bem pavimentado para que nos dispamos integralmente de nossa privacidade e façamos de conta que somos uma grande comunidade. Já não guardo este otimismo dos primeiros momentos da internet. Hoje tudo é uma grande ágora. Mas ainda podemos conspirar.

plágio preocupa. como lidar com ele?

Tem crescido o número de plágios por aí. É perceptível. Denúncias e notícias sobre esse tipo de apropriação tem circulado com uma velocidade e num volume maiores que anos atrás. O primeiro catalisador que nos vem à mente é a internet, que possibilita o já consagrado Control C-Control V com uma facilidade antes não encontrada. Mas se a web permite copiar e colar também permite identificar fraudes, cópias e outras violações do tipo.

Não se trata, portanto, de demonizar a internet, nem de confinar pessoas e obras. O advento de uma rede que permita fácil compartilhamento de arquivos de todos os tipos tem ajudado a desenvolvermos novos regimes de autoria. Não só a autoria coletiva e cúmplice (wiki!), mas o remix, o bricolage, a própria discussão acerca do que é obra, do que é autoria e dos limites do seu e do nosso. Isso tem forçado a juristas e a legisladores que revisem os marcos que regulam os direitos autorais. Isso tem causado confusões nas escolas, nas universidades, na mídia e na própria indústria cultural.

A autoria é um conceito relativamente recente, data lá do século XIII, mas só se consolidou mesmo no final de 1700. De lá pra cá, transportamos para o plano das ideias e das imaterialidades o regime de propriedade e paternidade que mantemos no mundo material. Posse, propriedade, detenção de direitos, possibilidade de queixa e disputa de territórios. O fato é que estamos vivendo um instante de instabilidade crescente nesse terreno. De novas demarcações de limites. Com isso, acontece de tudo. Na academia, professor plagia o colega; na escola, aluno copia o trabalho do coleguinha que mal conhece e que encontrou disponível na internet; na mídia, tem o jornalista que se apropria de trechos de textos de seus concorrentes, sem dar o devido crédito, e por aí vai… a lista é longa, cada vez mais diversificada.

Outro dia, Ramón Salaverría se queixava de ter sido plagiado por El Mundo . Nos Estados Unidos, um jornalista do New York Times foi demitido pela mesma prática. Na mesma semana, no Poynter, Kelly McBride escreveu sobre porque o plágio ainda rola tão solto por aí.

Não nos enganemos: há uma zona de atrito, uma disputa permanente quando o assunto é propriedade intelectual, ideias, conceitos. Os norte-americanos são tão preocupados com o assunto que criaram até mesmo um Centro de Integridade Acadêmica. Nas bandas de cá, o assunto ainda é tratado nas hostes de crime intelectual e de uma maneira dispersa, desorganizada e titubeante. Sei que, em muitas situações, é difícil caracterizar o plágio, identificar os infratores e puni-los. Mesmo tendo uma lei de direitos autorais e menção explícita no Código Penal .

De qualquer maneira, ainda é necessário reafirmar que plágio é um crime e que é uma prática antiética. Plágio não é um crime sem querer, mas um ato deliberado de quem acredita que não será pego e punido. Não se surrupia uma música ou um texto de alguém, apagando-se a assinatura de seus autores e registrando como de sua lavra sem querer, sem intenção. O plágio é um crime intencional, doloso, portanto. É uma atitude antiética porque desrespeita o direito de paternidade de alguém, porque atenta contra o direito moral de alguém de reivindicar sua autoria sobre algo. É uma conduta que menospreza as demais pessoas, acreditando que a verdade não virá à tona e que todos serão permanentemente enganados.

É preciso sim delatar os plágios, deplorar essas práticas, identificar os infratores e buscar suas punições. No jornalismo, na escola, na academia, no mundo das artes, em todas as esferas onde a originalidade, a primazia, a inovação e o senso criativo são realmente relevantes e definidores. O plágio precisa ser combatido e execrado. Ao menos até definirmos novas noções de autoria e de proteção de direitos aos que criam, aos que recriam e disseminam conteúdos que julgamos relevantes…

a confissão de um crime pela tv

Parecia coisa de cinema: um homem marcado pelo tempo, caminhando por um cemitério, com as mãos metidas nos bolsos do sobretudo, os cabelos esvoaçando no vento. Suas palavras secas dando a gravidade devida ao que ele contava: um crime. Parecia um filme, mas não era. Era a vida real, era uma pessoa notória confessando um crime cometido há alguns anos. Era o apresentador Ray Goslin, da BBC, no alto dos seus 70 anos, contando como matara seu ex-amante para ter de lhe poupar sofrimentos indizíveis por causa da Aids.

A confissão feita pela TV deve estar provocando tremores de terra na Inglaterra, além da prisão de Goslin.

Para além do carnaval midiático que se possa fazer com o episódio, me assaltam muito mais as questões éticas ali envolvidas. Não posso deixar de lembrar do caso do filósofo Louis Althusser que asfixiou a própria esposa, Helene, no quarto que dividiam e que lhe causou a pior condenação a que os franceses conhecem: a impronúncia. Em ambos os casos, temos pessoas célebres e aparentemente acima de quaisquer suspeitas ligadas a homicídios de pessoas amadas e próximas. Nos dois casos, temos ações motivadas pela compaixão à dor alheia e o cumprimento de pactos de lealdade extrema. Temos crimes sim, é verdade. Temos a violação da lei, a transgressão de valores, mas a manutenção de outros. Extermina-se a vida para pôr fim à dor, ao sofrimento. Faz-se pelo amor ao outro, para satisfazer um pedido… é a compaixão, o dó, a lealdade, o compromisso, o atendimento a uma súplica de quem se ama. Mesmo que essa resposta se traduza na morte do outro amado…

Nos dois casos, Althusser e Goslin colocam seus nomes no rol dos homicidas, dos degredados, dos imperdoáveis. Do inapelável.

Difícil é defender seus atos, fácil condená-los. Difícil é aceitar o que fizeram, mesmo que os juristas atribuam um rótulo eufêmico: o suicídio assistido. Mas é preciso entender que seus atos não foram intempestivos, irracionais ou impensados. Suas decisões de cunho prático passaram inevitavelmente por seus escrutínios morais. Goslin e Althusser colocaram seus princípios e seus sentimentos na balança de maneira a ver o que mais pesava, o que mais fazia sentido, o que mais preenchia seus corações e mentes. O filósofo e o comunicador, ambos homens vividos e experientes, devem ter consumido noites pensando antes de sufocarem suas vítimas. E talvez essa palavra – “vítimas” – não seja a mais apropriada para as situações. Naturalmente, não devem ter visto seus objetos de amor como vítimas de suas ações, mas vítimas maiores de seus sofrimentos.

O que mais distingue o caso de outro é a confissão pública de Goslin. Segundo colegas de trabalho mais próximos, o apresentador decidiu contar o que havia feito num programa de TV por uma questão de coerência, de lealdade, de fidelidade ao público. Ele preparava um programa sobre a morte e vira tantas fontes abrindo seus corações e contando suas histórias que não achara justo guardar para si a sua própria. Goslin contou. Nunca saberemos o quanto há de interpretação e de espontaneidade no curto minuto de sua fala no vídeo de sua confissão. Como antes, Goslin deve ter pensado muito antes de agir. Meditou, pesou, tomou a decisão. Seu semblante está carregado, seus cabelos dançam ao sabor do vento. Ele nos oferece cada palavra como se oferecesse seu pescoço. Abre o segredo, olha diretamente a câmera e baixa o rosto, compungido. No segundo em que se detém olhando para a frente, confessa como se nos olhasse direto nos olhos. Depois, deixa cair a cabeça e se retira do enquadramento da câmera. São segundo apenas, mas o drama está lá. O drama da escolha ética, o drama de quem tem a coragem de tomar uma decisão, estando ela certa ou errada. Pouco importa ao leitor agora se concordo ou não com a ação de Goslin. Mais relevante é ver como é preciso ter coragem para decidir, para tomar caminhos, para aceitar o vento no rosto após dar o primeiro passo.

Escolher entre matar o amante ou deixá-lo sofrer até que seja naturalmente levado é uma decisão ética. Escolher entre manter o segredo ou confessar o crime diante das câmeras para todos é uma decisão de cunho ético. A vida exige coragem, pois as escolhas precisam ser tomadas a todo o momento. Alguém já falou que a vida não tem ensaio e que se aprende a viver, vivendo. O episódio de Goslin nos confirma tudo isso e nos mostra como hoje, mais do que nunca, os segredos adormecem mas não têm um sono pesado. As câmeras são nossos olhos, são confessionários. As comunidades imaginadas são coletivos de cumplicidade. Os crimes continuam a acontecer debaixo de nossos narizes e pouco ou nada sabemos deles.

É profundamente triste o que aconteceu com Goslin e seu parceiro. Seu drama me assaltou e me impeliu a escrever essas poucas linhas sobre um assunto tão complexo. Um tema que nunca poderia se esgotar num post: esta certeza de que estamos sós em nossos momentos mais verdadeiros, onde se deve refletir e tomar decisões. Incontornavelmente. Indefinidamente.

uma espiadinha nas capas dos jornais: e o arruda, hein?

O Dia – Rio de Janeiro
“Um, dois, três! Arruda no xadrez!”

Extra- Rio de Janeiro
“Arruda não vem para o desfile da Beija-Flor. Foi preso”

Correio Braziliense – DF
“Arruda é preso. DF sob ameaça de intervenção”

Hoje em Dia – Belo Horizonte
“Arruda atrás das grades”

liberdade de informação em 14 países

Acaba de sair em português o livro Liberdade de Informação: um Estudo de Direito Comparado, de Toby Mendel. A iniciativa é uma aproximação das realidades e marcos regulatórios da área em quatro continentes: América, Europa, Ásia e África.

A iniciativa é do setor de Comunicação e Informação do escritório da UNESCO no Brasil, com o apoio da Secretaria Estadual de Planejamento de Mato Grosso. O livro tem versões online (baixe aqui) e impressa, e a  tradução para o português foi feita a partir da segunda edição, revisada e ampliada da obra.

Leitura obrigatória para quem se interessa por regulação de mídia, liberdade de imprensa, legislação da comunicação, democracia e desenvolvimento, e assuntos ligados.

ética, interesse público e direito à informação

Dois eventos internacionais acontecem neste mês e trazem luz a importantes debates sobre ética jornalística, pesquisa científica na área, interesse público e direito à informação.

São eles:

  • “7º Congreso Internacional de Ética y Derecho de la Información”, que acontece em 13 e 14 de novembro em Valência, Espanha. O tema é “A liberdade das consciências na regulação do direito à informação”. O site do evento é este aqui.
  • “Journalism Research in the Public Interest”, evento da European Communication Research and Education Association, que acontece entre 19 e 21 de novembro em Zurique, Suíça. O link é este.

presentinhos de sexta

Como o final de semana se aproxima, deixo três presentinhos:

1. A reconstrução do jornalismo americano. Relatório recente – do último dia 20 -, assinado pelos professores Leonard Downie Jr e Michael Schudson, das universidades do Arizona e de Columbia. Em inglês, em PDF e com 100 páginas. Aqui.

2. A emergência das redes sociais e os seus impactos no jornalismo convencional. Estudo recente sobre a realidade do Reino Unido assinado pelo Reuters Institute for the Study of Journalism. Em inglês, em PDF e com 60 páginas. Aqui.

3. Recentemente, tratei da Ley de Medios argentina, polêmico marco regulatório que pode alterar sensivelmente o mercado audiovisual daquele país. Aliás, a lei está aqui. Em espanhol, em PDF e com 25 páginas.

por que a lei argentina de meios assusta?

coloquio_maria_victoriaO Senado argentino aprovou recentemente uma nova lei para os meios audiovisuais, estabelecendo restrições à propriedade e impondo novas regras no mercado midiático local. As medidas são polêmicas, e contrapuseram não apenas oposicionistas e aliados da presidente Cristina Kirchner, mas também setores organizados da sociedade que tentam democratizar os meios na Argentina e grandes conglomerados de mídia.

Antes de ser aprovada pelos senadores, a nova lei foi intensamente discutida. Aprovada, pode trazer modificações sensíveis no panorama e ainda contagiar países vizinhos, como Brasil, e aprovarem dispositivos semelhantes que ataquem oligopólios. Por aqui, a gritaria não foi pouca. Para o Estadão, a medida é um atentado do governo para cercear a mídia, principalmente o poderoso grupo Clarín, que está em rota de colisão com os Kirchner há meses.

Mas há setores que vêem a nova lei argentina com muito bons olhos. Maria Victoria Richter é jornalista e militou durante anos no Observatorio de Medios da União dos Trabalhadores da Imprensa de Buenos Aires (UTPBA). Atualmente, Victoria é assessora da senadora Maria Rosa Díaz, que nem é partidária do governo, mas votou a favor da “Ley de Medios”. A jornalista argentina acompanhou de perto a tramitação do projeto.

Veja trechos da entrevista.

1. Por que o processo de aprovado da “Ley de Medios” não foi um processo tranquilo?
Por que existem empresas que concentram o mercado audiovisual e não estavam dispostas a dividir o espectro radioelétrico com outras lógicas de comunicação.

2. A quem interessa existir uma lei como essa?
Interessa à comunicação sem fins lucrativos, aos trabalhadores dos meios, jornalistas, atores, músicos, cineastas e produtores argentinos que estão contemplados na lei. Deveria interessar à audiência, já que lhe é garantido o acesso a outras formas de comunicação, sem interesse comercial exclusivamente e incentivando os meios públicos.

3. E por que tanto temor ou indisposição com a lei?
O medo é de um setor da oposição que conta com apoio dos principais jornais, pertencentes aos mesmos grupos afetados, o que cria um clima de tensão compreensível quando são atingidos interesses econômicos tão fortes.

4. Quais são os aspectos positivos da lei?
É uma boa lei, amparada na legislação internacional em matéria de comunicação, e que recebeu o apoio de centenas de organizações sociais, de amplos setores da cultura, agremiações e universidades, além da relatoria de Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Unesco.

5. Que tipo de transformações a nova lei pode trazer para o cenário de comunicações argentino?
Se for aplicada, a lei pode transformar radicalmente o mapa dos meios locais. Além de gerar múltiplas fontes de trabalho e garantir um acesso mais democrático às concessões de radiodifusão. Para além do sucesso de sua aplicação, que implicará novas lutas por parte dos movimentos sociais, esta lei já gerou uma nova possibilidade de discussão sobre o papel social dos meios de comunicação. Pela primeira vez na Argentina, discute-se que o espectro radioelétrico pertence a todos e que o setor privado não é proprietário do espaço comum, ainda que possa usá-lo.

6. Você assessora uma senadora que votou a favor da lei. Como é a sua posição frente o governo Kirchner?
Minha senadora, María Rosa Díaz, representa uma província argentina – a Terra do Fogo – que tem uma relação complicada com o governo. Mas isso não impediu que reconhecesse uma boa iniciativa que estabelece uma nova norma que beneficia setores que não têm voz nos meios massivos de comunicação. Trata-se de uma lei que vai transcender governos e que resulta num avanço da democratização do espectro.

7. Os Kirchner querem mesmo fazer calar os meios de comunicação?
Os Kirchner têm uma forma questionável de gerir a coisa pública, sem muita transparência e com várias denúncias de exercer o poder pressionando aqueles que não se alinham às suas políticas. Eles têm um discurso com muitas ideias progressistas, mas sua prática nem sempre o acompanha. No caso da lei de serviços de comunicação audiovisual, muitos que não comungam de suas particulares visões decidiram acompanhá-los porque reivindicamos historicamente (desde a redemocratização) uma lei que garantisse o acesso de todos os setores no processo da comunicação.

tem curso de jornalismo em todo lugar

Logo depois da sessão do Supremo Tribunal Federal que exitingui a obrigartoriedade do diploma, uma das mais correntes previsões era de que o mercado de ensino de Jornalismo seria altamente prejudicado com a decisão. Instituições fechariam seus cursos, escolas deixariam de existir, já que – para entrar no mercado de trabalho – o diploma tornara-se dispensável.

Fiz questão de argumentar que tão difícil quanto abrir um curso é fechá-lo, e que nenhuma instituição de ensino considera essa uma boa saída, pois afeta a sua imagem, causa constrangimento e dissemina uma sensação de fracasso escolar. Afinal, se você está abrindo um curso, está expandindo. Encerrar atividades é justamente o contrário. Considero ainda que os alunos que buscam os cursos de Jornalismo não o fazem, na sua maioria, para atender a uma questão burocrática para sua habilitação. Isto é, não estudam por conta do diploma, mas procuram caminhos para a sua profissionalidade, para o seu ingresso no mercado de trabalho. Uma demonstração desse comportamento padrão está ao lado dos cursos de Jornalismo, nos de Publicidade e Propaganda, carreira que não exige diploma para atuação profissional, mas que é uma das mais procuradas em vestibulares e processos seletivos.

Mas é claro que a decisão do STF provocou solavancos no mercado de ensino de Jornalismo.

Fechando as portas
Nem mesmo o Instituto de Pesquisas em Educação Anísio Teixeira, o Inep, sabe ao certo quantos cursos de Jornalismo existem no Brasil. Os dados são conflitantes entre os diversos órgãos ligados ao Ministério da Educação. Por isso, é difícil estimar mesmo que tipo de impacto a decisão do Supremo terá sobre os cursos da área.

Informações já circulam pela internet de que duas instituições aproveitaram a ocasião para tomar decisões que já estavam no seu horizonte: fechar as portas de cursos com pouca procur. Foi o caso da Universidade de Uberaba (Uniube), cuja turma que seria formada através do vestibular de junho foi cancelada. A Facamp, por sua vez, encerrou o curso, argumentando que o final da exigência do diploma iria impor uma nova orientação aos cursos pelo país.

Até agora são essas as notícias sobre extinção de vagas nos cursos, bem aquém do vendaval apocalíptico que muitos alardearam. Mas olhando mais de perto, o que percebe são outros movimentos, alguns mais ruidosos, outros nem tanto, que apontavam justamente para o caminho oposto. Quer dizer, estão surgindo novas oportunidades no ensino de jornalismo. Não é o aparecimento de novos cursos superiores na área, mas o oferecimento de formação na área, para além dos meios convencionais de instrução formal. Tem empresas dando cursos, entidades, e até mesmo coletivos de jornalistas investindo em cursos mais curtos e dirigidos.

Abrindo vagas
No sentido contrário do fechamento maciço que se propagou entre os cursos de Jornalismo, surgem iniciativas que merecem atenção. Os programas de trainee de alguns veículos jornalísticos brasileiros estão de vento em popa. Os cursos de formação na Abril, no Estadão e na Folha continuam atraindo milhares de aspirantes a jornalistas, sempre projetando a imagem de que são cursos bem consolidados e altamente práticos. Os estudantes parecem buscar nessas iniciativas oportunidades de aprenderem o que não tiveram acesso em suas universidades. Isso é altamente questionável, mas os cursos das empresas são uma realidade já bem conhecida pela academia e pelo próprio mercado. Se eles “adestram focas” – como propaga do Estadão – ou não, é uma discussão posterior.

Recentemente, o Programa de Treinamento da Folha foi além do oferecimento de vagas, e lançou um livro que pretende ser uma espécie de manual para esta etapa de formação: “Jornalismo Diário”, de Ana Estela de Sousa Pinto, traz dicas importantes para os iniciantes, mas não consegue disfarçar o espírito que pauta o jornal quando se trata da formação de jornalistas. Praticamente ignora a academia e se apoia em fórmulas que parecem formatar os jovens jornalistas para o modo-Folha-de-ver-o-mundo.

Fora do Brasil, outros conglomerados também têm suas iniciativas de formação profissional, a BBC tem o seu college para reciclar seus repórteres e editores, e Reuters, um respeitado instituto de estudos em jornalismo.

Dado que me parece novo no contexto brasileiro é o surgimento de cursos dados por coletivos de profissionais, como a Escola de Comunicação, do Comunique-se, e a Escola Livre de Jornalismo, por exemplo. São cursos curtos e mais dirigidos, semelhantes a oficinas práticas, e notadamente voltados ao aperfeiçoamento de profissionais. Mas estudantes da área também se matriculam e ajudam a compor turmas inteiras. Há iniciativas, no entanto, que causam alarde por seu tom mercantilista e miraculoso: formar profissionais de sucesso em curso de 45 horas!

O mercado está tão movimentado em oportunidades que já existe inclusive um site que reúne informações sobre cursos e palestras sobre jornalismo. O internauta pode inclusive assinar gratuitamente uma newsletter semanal, que informa as principais novidades na área da formação.

E os estudantes?
Os aspirantes a jornalistas não podem se queixar da carência de possibilidades de formação. Os cursos superiores da área sempre são muito criticados pelo mercado, que alega que sua orientação é excessivamente teórica, e que os jovens profissionais chegam aos postos de trabalho sem o ritmo de produção esperado. Os cursos que abundam por aí não garantem isso, e há uma agravante: não há qualquer fiscalização ou controle de qualidade sobre essas palestras, minicursos ou oficinas. Diferente do que existe dentro do sistema formal de educação, via Inep e MEC. Nos cursos de pós-graduação – principalmente mestrados e doutorados -, a Capes exerce seu papel neste sentido.

Nos Estados Unidos, há indicativos que os cursos superiores vêm atraindo mais e mais estudantes. E lá, o diploma não é exigência para se atuar nas redações. Isso não significa que professores, profissionais e estudantes dêem menos atenção ao problema. Pelo contrário: Robert Niles, por exemplo, salienta oito coisas que os alunos deveriam exigir de suas escolas, e Suzanne Yada lidera um coletivo de estudantes de jornalismo que discute qualidade, conveniência e atualidade da formação ali oferecida.

Por aqui, movimentos de estudantes semelhantes seriam muito bem-vindos.

Um novo mercado de formação?
As diversas iniciativas de cursos que acabei de mencionar não chegam a configurar um novo mercado na área de formação profissional. Mas também não é o caso de ignorar esses movimentos, pois eles salientam demandas que nem sempre são supridas pelos cursos convencionais. Neste sentido, faculdades e universidades têm observado essas iniciativas, ora rechaçando preventivamente, ora buscando aproximações estratégicas.

Trata-se de concorrência? Nem sempre. Mas a presença desses novos players no mercado, associada a mudanças que se avizinham com novas diretrizes para os cursos e a não exigência do diploma, tudo isso, combinado, deve provocar alterações sensíveis na rota dos cursos de Jornalismo no país.