uso de mídia define gerações: será mesmo?

O Link, caderno de tecnologia de O Estado de S.Paulo, trouxe matéria sobre estudo da agência Adge/Magid Generational Strategies que apontaria uma ligação direta entre consumo de certas mídias por grupos etários em faixas de horário do dia. Quer dizer: o uso do meio ajuda a definir a sua geração. Típico caso de determinismo biotecnológico, fácil da gente “comprar” mas igualmente fácil de desbancar.

Veja a matéria aqui, o estudo aqui e um infográfico aqui.

Digo que a gente embarca nessa história com facilidade porque estudos deste tipo nos “ajudariam a explicar as mudanças pelas quais estamos passando nos últimos anos”, separando em gavetinhas as espécies de usuários e organizando a bagunça em que vivemos. Mas a coisa não é assim tão tranquila.

Se as gerações funcionam assim, como explicar os casos de velhinhos que estão nas redes sociais, que blogam, que se comunicam com seus netinhos pelo Skype, que postam suas fotos familiares no Flickr ou coisas do tipo? Como explicar que existem jovens usuários que não são necessariamente heavy users ou nerds de plantão, apesar de seus colegas serem? Eles são desvios da norma? São exceções à regra? Não se pode afirmar porque não há dados científicos que o coloquem dessa maneira…

Isto é, embora gostemos da piadinha que elogia as novas gerações por estas “virem software embarcado atualizado”, as formas de apropriação dos meios seguem regras que transcendem as biológicas: são culturais, sociais, contextuais, históricas. Quem dá bons argumentos nessa direção é o sagaz Clay Shirky, professor da Universidade de New York e autor de um livro inspiradíssimo: Cultura da Participação. Segundo Shirky, as gerações podem se diferenciar no uso dos meios não por aspectos inatos, ligados a sua genética ou coisa do tipo. Hiatos podem surgir entre elas por conta das oportunidades diferentes que elas têm de se apropriar de algo, de trazer isso para suas vidas e de transformar suas existências com essas novas chances.

O raciocínio de Shirky ajuda a explicar porque hoje milhões de pessoas – de todas as gerações – compartilham mais suas experiências nas novas mídias, articulam-se mais em torno de causas cívicas (ou não), buscam se organizar pela web e forçam a porta da participação nos meios convencionais. Temos atualmente mais oportunidades de fazer coisas que antes ficavam relegadas a grupos mais restritos. Temos capacidade de nos conectar mais rapidamente e mais facilmente a grupos de semelhantes, o que facilitaria trabalhar de forma coletiva. Não é, portanto, um fenômeno geracional; é histórico; é o momento. Segundo Shirky, temos os meios, os motivos intrínsecos para fazer isso e as oportunidades. Junte tudo, bata e coloque no forno. O resultado é o que o autor chama de “excedente cognitivo”.

Não disse que essa coisa do determinismo geracional era fácil de contrariar?

Não disse que as ideias do Shirky são interessantes?

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